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NO VAGAR DA PENUMBRA

NO VAGAR DA PENUMBRA

TRIBUNAIS, SUSPEITOS, INSUSPEITOS

Junho 25, 2014

J.J. Faria Santos

A tensão entre o poder executivo e o poder judicial não é, naturalmente, uma originalidade portuguesa. “Deus salve os Estados Unidos deste Tribunal antidemocrático” é o título de um artigo de Jedediah Purdy no The Daily Beast, e as interrogações não se ficam por aqui. Admitindo que a instituição judicial é o órgão de poder mais respeitado nos estudos de opinião, “bem à frente do Congresso e da Presidência”, Purdy formula a questão que para ele é essencial: “Deve uma democracia que se respeita ter um Supremo Tribunal como o nosso, com o poder de reverter legislação democrática?”, e acusa a instituição de exercer um poder “místico”, fazendo uma “interpretação oracular” da Constituição.

As mais recentes decisões do Tribunal Constitucional português, não sendo imunes à crítica, pela sua diversidade, pela heterogeneidade das maiorias que as aprovam e pela dimensão numérica dos juízes que as suportaram não autorizam nem a guerrilha institucional movida pelo Governo, nem a confissão do Executivo da própria incapacidade de conformar a sua legislação aos ditames constitucionais. O provocatório pedido de “aclaração” teve do TC a resposta óbvia: “Não cabe ao Tribunal Constitucional esclarecer outros orgãos de soberania sobre os termos em que estes devem exercer as suas competências no plano administrativo ou legislativo”.

 

Quem poderia ajudar o Governo a legislar de acordo com a Constituição (se ele não tivesse a intenção oculta de demonstrar o estado de obsolescência desta e a necessidade premente de uma revisão profunda) era Paulo Mota Pinto, ex-juiz doTribunal Constitucional, actual deputado do PSD e candidato a presidente do Conselho de Administração do BES. Mota Pinto não tem experiência bancária, mas o mesmo não pode ser dito de uma das futuras administradoras- executivas do banco, Rita Barosa, que foi secretária de Estado de Miguel Relvas.

Entretanto, Ricardo Salgado, seguro do seu estatuto ou em estado de desespero, procurou, junto do primeiro-ministro a quem ajudou com uma entrevista televisiva a chegar mais depressa ao poder, apoio para que um sindicato bancário liderasse um empréstimo ao BES de 2,5 mil milhões de euros. Pôs todas as cartas na mesa e jogou o trunfo do “risco sistémico”. E ainda queria que as taxas de juro dos empréstimos fossem bonificadas. Recebeu de Passos Coelho a resposta que já recebera da ministra das Finanças e que viria a receber de altos responsáveis e investidores angolanos: não.

Não é claro se desta atitude de Passos Coelho se pode extrair uma vontade de libertar o   poder político da pressão dos interesses do sector financeiro, ou se se tratou de uma manifestação de força perante um banqueiro enfraquecido. Neste como noutros casos, porém, o que causa mais estranheza é a situação que Pacheco Pereira formulou exemplarmente num artigo para o Público (edição de 21/06/2014): “…não se percebe como banqueiros envolvidos em evasão fiscal e manipulação de contas (…) não são imediatamente impedidos de exercerem actividades na banca, acto que depende dos reguladores, mesmo antes de a justiça se pronunciar sobre os eventuais crimes cometidos, se é vai alguma vez pronunciar-se.”

 

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