O CEO DO SAQUE AO FUNDO
Julho 17, 2022
J.J. Faria Santos
Desde o início que o negócio da venda do Novo Banco ao Lone Star foi um convite ao “saque” ao Fundo de Resolução. O risco moral (o risco imoral, mais exactamente) era elevado, mas no mundo da alta finança o risco que conta é o sistémico. António Ramalho desempenhou com brio a função de CEO do saque ao fundo, minimizando, com aquela leveza com que os escolhidos para as missões históricas escolhem um rumo jamais se desviando dele, conflitos de interesse e vendas de activos ao desbarato. É por isso que quando o Tribunal de Contas conclui, na sua auditoria, que a administração do Novo Banco “não salvaguardou o interesse público”, designadamente por não usado mais parcimoniosamente o financiamento público, brada aos céus tamanha ingenuidade ou despropósito. O objectivo principal do CEO era defender os interesses da Lone Star, da mesma forma que ao Banco de Portugal interessava a preservação da “estabilidade financeira” e afastar os “cenários de liquidação”.
António Ramalho foi um fiel executor de uma estratégia, que incluiu na área da comunicação a defesa objectiva da opacidade, a inundação da comissão de inquérito parlamentar com doses cavalares de documentos para dificultar o escrutínio e o patrocínio do treino dos depoentes. “Pensar que um banco era capaz de manipular uma comissão de inquérito, pessoas que respondiam perante essa comissão de inquérito, parece-me de um mundo totalmente virtual”, disse no início do ano em entrevista à CNN Portugal o prezado CEO, usando a táctica de nomear o aparentemente evidente com o objectivo de alardear inocência porque doutro modo sentir-se-ia impelido à ocultação. Ramalho, no fundo (as variadas declinações da palavra “fundo”), é um patriota, uma daquelas figuras que engrandecem a pátria pelo simples facto de aos olhos dos “estrangeiros” (criaturas civilizadas, inovadoras e progressistas) demonstrarem a excelência dos gestores portugueses. E como o Estado só atrapalha, nada como “distribuir” o dinheiro público por entidades privadas. O Comité de Remunerações do Novo Banco atribuiu chorudos prémios de desempenho (e que desempenho!) a Ramalho e sus muchachos. Terá recebido o reconhecimento da elite financeira, a tal que mede o mérito pelo Relatório e Contas e pelas flutuações da bolsa.
Quanto ao mecanismo de confiança contingente usado pela generalidade da população, o CEO do saque ao fundo ficou de mãos a abanar. Nada que o preocupe, claro. Disse ao Jornal de Negócios, em Abril, que a sua “integridade profissional nunca foi posta em causa” e que antecipado o fim do seu “compromisso” com o banco lhe resta agora ainda o “compromisso de 39 anos com a família”. O descanso do guerreiro premiado no seio da família é o capítulo que se segue.
Imagem: sapo.pt