MUSK - O PERFUME DE MARTE
Maio 01, 2022
J.J. Faria Santos
Estivéssemos a falar do exercício de um poder benévolo, onde uma fulgurante inteligência se combinasse com uma atitude conciliatória, e as reacções à tomada do Twitter por Elon Musk não teriam tido a violência que faz jus ao ambiente efervescente da própria rede social em causa. Sucede, porém, que Musk é uma personalidade abrasiva com um historial onde se combinam o ambiente laboral tóxico nas suas empresas (incluindo acusações de racismo e de assédio sexual), a propagação de teses negacionistas em relação à Covid-19, declarações despropositadamente insultuosas ou mesmo difamatórias e uma predilecção por um conceito maximalista de livre expressão, complacente com a mentira e a desinformação e disruptora das sãs relações sociais e da democracia.
Numa recensão ao livro de Ashlee Vance Elon Musk: Tesla, SpaceX, and the Quest for a Fantastic Futur, Sue Halpern escreveu em 2015 na New York Review of Books que Musk “tem todos os atributos de um narcisista clássico – a grandiosidade, a ânsia de fama, a falta de empatia, a crença de que é mais inteligente que os outros, e o plano messiânico para salvar a civilização”. Ao mesmo tempo que reconhecia o seu perfil visionário, Halpern descortinava no retrato que Vance dava do sul-africano uma “ambição feroz” e, acima de tudo, uma condição de “bancarrota emocional”, que o tornava terrivelmente inadequado como gestor de recursos humanos.
Num recente artigo de opinião no New York Times, onde prognosticou o agravamento do ambiente radicalizado do Twitter, pouco dado ao “discurso racional, matizado”, Greg Bensinger considerou que “as razões para o Sr. Musk tomar o controlo do Twitter não se prendem com a liberdade de expressão; do que se trata é de controlar o megafone”, tratando a rede social como um amplificador dos seus interesses e das suas ideias, e como um rolo compressor dos seus críticos. A revista Time colocou na sua capa uma ilustração do dono da Tesla com o símbolo do Twitter engaiolado. Se o génio de Musk se aproximar do extremo oposto, a loucura, o resultado será transformar o Twitter numa espécie de cage aux folles?
Imagem: Time.com