ANDRÉ, O BEM-AVENTURADO
Setembro 28, 2024
J.J. Faria Santos
Pedro Nuno Santos quer empurrar Luís Montenegro para os braços de André Ventura, dizem uns. André Ventura está mortinho por acolher nos seus braços Luís Montenegro, acrescentam outros. O que ninguém ou poucos dizem é que Montenegro, colocado entre a espada e a parede, não hesitará em derrubar a divisória e criar um open space de convívio com os portugueses de bem. Confrontado com a proposta “radical e inflexível” do PS, nada como negociar com o radical flexível Ventura, notável seguidor dos princípios de Groucho Marx, propagandista de fake news e malabarista de propostas. Radical por radical, antes o de direita, alumnus de Passos Coelho e cruzado da portugalidade. Confrontado com as linhas rosa, o primeiro-ministro fará implodir as linhas vermelhas. Além do mais, o “não é não” aplicava-se a um “acordo político de governação”, não à viabilização de um orçamento. E o Chega, que nos dias mais lúcidos aspira à respeitabilidade, tem aqui uma boa oportunidade.
Pode ter sido coincidência a declaração do PM prometendo mão pesada aos responsáveis pelos fogos, anunciando que o Governo não iria “regatear nenhum esforço na acção repressiva”, bem como a alusão recorrente a “interesses particulares” na origem das ignições. Ou o anúncio esta semana da criação da unidade de controlo de fronteiras e fiscalização de imigrantes. Se recordarmos que Montenegro considerou o combate à corrupção uma prioridade desde a “primeira hora”, temos aqui campo de entendimento. A que acresce o facto de o Chega ser favorável à descida do IRC, matéria que o chefe do executivo considera estratégica para a sua política económica. Em Maio de 2023, inspirado por um encontro com o ilusionista Luís de Matos, Montenegro declarou que era importante fazer “desaparecer o socialismo de Portugal”. Para manter agora o socialismo à distância, se for preciso acomodam-se os caprichos do demagogo populista.
Não sendo de descartar a hipótese de o líder do PSD se sentir tentado a forçar eleições, aproveitando, como alguém disse, o frontloading de benesses, não é certo que, mesmo recorrendo à vitimização, os resultados fossem suficientemente apelativos. Por outro lado, o rural Montenegro (que já beneficiou da opção presidencial de recorrer a eleições na sequência da demissão de António Costa), evitando novo sufrágio, ganharia capital político perante o urbano Marcelo. Quem sabe se, mais tarde, este não retribuiria a atenção, congeminando um momento mais propício para o seu PSD ir a eleições, arranjando um leque de justificações criativas cuja especialidade decerto já patenteou. Se é certo que não são propriamente best buddies, a cooperação institucional aproxima-se tanto do conluio que até o circunspecto Expresso sugere que “se entende ser assim tão importante evitar uma crise, Marcelo mais do que convocar conselhos de Estado, tudo deve tentar para levar Montenegro a negociar de forma decisiva e séria com o líder da oposição”. Luís, André e Marcelo podem constituir a troika decisiva para a aprovação do orçamento.