A PERCEPÇÃO DE QUE MONTENEGRO É O MAIS BEM PREPARADO PARA GOVERNAR
Abril 06, 2025
J.J. Faria Santos
Sabemos que o incumbente está sempre em vantagem. Vestido o fato de primeiro-ministro, adquire solenidade, alguma pompa e a autoridade do conhecimento a que só os ungidos acedem. Na recente sondagem da Universidade Católica, os portugueses consideram que Luís Montenegro é o mais bem preparado para governar, por comparação com Pedro Nuno Santos. O que alimentará esta percepção?
Os inquiridos pelo estudo consideraram o actual primeiro-ministro mais bem preparado para o cargo (46% / 31%), mais competente (44% / 31%) e mais capaz de promover o crescimento económico (50% / 30%). Em que consistirá esta vantagem comparativa? Na licenciatura em Direito e na pós-graduação em Direito de Protecção de Dados Pessoais, por comparação com a licenciatura em Economia do líder do PS? Na experiência empresarial no ecossistema de Espinho e arredores? E se a economia cresceu em 2024 menos do que em 2023, o que é que o torna mais capaz de promover o crescimento económico? Algum programa miraculoso ainda na incubadora ou a profissão de fé no efeito indutor de crescimento do PIB da redução do IRC? Seguramente que não pesará no julgamento que os portugueses fazem da sua preparação para o cargo a capacidade de gerar consensos ou a experiência no serviço público, casos em que, respectivamente, as pastas de secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares e de ministro das Infra-estruturas e da Habitação conferiram a Pedro Nuno Santos tarimba e perspectiva.
O primeiro-ministro e o líder do PS surgem empatados no item da capacidade para combater a pobreza (36%), o que pode ser resultado do capital adquirido pelos socialistas, fruto da sua acção governativa. O esforço da AD para reforçar os rendimentos dos reformados (numa dimensão inferior à dos governos socialistas anteriores) e alargar os beneficiários do CSI pode ter sido insuficiente. E se a vantagem que Montenegro tem na capacidade para resolver os problemas da habitação (42% / 31%), não obstante não se terem verificado melhorias significativas, pode ser interpretado como uma censura ao desempenho ministerial de Pedro Nuno Santos, a crença no talento de Montenegro para resolver os problemas da saúde (39% / 33%) é quase do domínio do sobrenatural, dado o desempenho desastroso da ministra.
Uma nota final para destacar que os inquiridos na sondagem consideraram o primeiro-ministro mais honesto (35% / 32%) e mais digno de confiança (40% / 34%) do que o seu adversário socialista. É importante referir que, por comparação com o estudo anterior de Fevereiro de 2024, houve uma quebra acentuada na dimensão da honestidade (vantagem reduzida de 13 pontos percentuais para apenas 3) e uma erosão bastante significativa da confiança (vantagem de 11 pontos percentuais reduzida para 6).Tendo em conta que 60% dos entrevistados consideraram que Montenegro deveria ter encerrado a sua empresa familiar, que 69% foram da opinião de que os seus esclarecimentos foram insuficientes e que 46% defenderam que teria sido preferível que ele se tivesse demitido (ocorrendo a nomeação de outro primeiro-ministro da área do PSD), é natural que tenham sido afectadas a confiança e a percepção da honestidade do primeiro-ministro. É compreensível que a confiança seja corroída pela percepção de que um primeiro-ministro esquivo e sinuoso nas suas explicações prefira faltar a uma cimeira europeia para jogar golfe com um amigo, cuja empresa, por coincidência, contribui significativamente para os lucros da Spinumviva, empresa familiar para todo o serviço.
Ninguém sabe como evoluirão estas percepções até ao dia das eleições. Se prevalecerá a ideia de colar o rótulo de radical e de impulsivo a Pedro Nuno Santos. E se Montenegro será premiado pelo seu estilo comunicacional altamente controlado e avarento, como se a escassez da palavra alimentasse a imagem do fazedor (ou doer como diria Passos Coelho), que só não parece radicalmente ascético porque ele permite que o esgar de um sorriso assente nos seus lábios. Pode ser que o homem que Miguel Poiares Maduro disse que “transforma o escrutínio numa ofensa” vença cavalgando a vitimização, e a eventual vontade do eleitorado de que a alternância tenha mais tempo para mostrar o que vale. Ou não vale.