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NO VAGAR DA PENUMBRA

NO VAGAR DA PENUMBRA

O NOVO HOMEM DO LEME

Junho 08, 2025

J.J. Faria Santos

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Os grandes vultos têm espírito cénico. Foi no International Club of Portugal (where else?), em Outubro de 2021, que Gouveia e Melo desejou não se “deixar cair na tentação” da política, porque “a democracia não precisa de militares” e porque “o militarismo excessivo não faz sentido”. Foi nesse mesmo dia que asseverou: “Se isso acontecer, dêem-me uma corda para me enforcar”. Se as proclamações definitivas nunca são um nó cego nas possibilidades de um político de carreira, também não o são para alguém experimentado na arte de marinheiro (nós, voltas, falcaças), subitamente empenhado numa carreira na política. A eleição de Trump criou uma “situação preocupante”, desatou o nó do impedimento e concretizou a tentação de Passaláqua.

 

Gouveia e Melo é o candidato catch-all, o novo homem do leme (“Aqui ao leme sou mais do que eu: / Sou um Povo que quer o mar que é teu;”) e o mostrengo é a falta de visão estratégica e de “cultura organizacional”. É o candidato do “centro pragmático”, da moderação, com Portugal na “camisola interior”, apostado em “falar menos, e a falar só quando for necessário sobre coisas substantivas”, e diz-se imune a influências. Em tempos de derivas populistas, é alguém que vem de fora da política, “não aceita que partidos políticos ou grupos organizados” o apoiem”, muito menos que André Ventura se junte às suas “comitivas”. Com a sua aura de autoridade e integridade, e o seu activo de disciplina e organização, Gouveia e Melo parece, para muitos, o homem certo na hora certa, em que de novo “Tudo é incerto e derradeiro / Tudo é disperso, nada é inteiro, / Ó Portugal, hoje és nevoeiro… / É a hora!”)

 

Mas o almirante também suscita dúvidas e interrogações. Há um excesso de voluntarismo que tem procurado mitigar. A ligeireza com que considerou que “vai haver alguma afectação nas despesas sociais” para permitir um maior investimento em Defesa, e a retórica alarmista com que a justificou -  “o que interessa também ter despesas sociais se não tivermos país?”, já foram minimizadas. Outras afirmações que parecem indiciar uma visão maximalista dos seus poderes despertam receios de intervencionismo desestabilizador. Procurando tranquilizar os traumatizados do eanismo, o almirante já veio assegurar que é “contra a Presidência fazer partidos”, porque isso “poderia ser perigoso para a própria democracia”. Mas se o homem que achava que a democracia não precisava de militares, mudou de opinião por causa da situação internacional, o que nos garante que um bloqueio partidário e/ou do regime não o levará a patrocinar/ encabeçar um novo partido político?

 

Curiosamente, o eanismo, por delegação conjugal, apoia Marques Mendes, que quer ser “mediador” em vez de moderador. Seguro pode não ser mediador nem do “centro pragmático”, mas “nasceu no interior e vive no centro”, e é “exigente com a ética” (condição potencialmente conflituosa com a visão laxista do primeiro-ministro). Gouveia e Melo, quanto ao Estado social e à Defesa, avança com uma alegoria: “É canhões e manteiga. Neste caso, os canhões para proteger a manteiga, e, claro, a manteiga para sustentar as pessoas que estão a tratar os canhões". Esperemos que não seja o último tango da República.

 

(Versos citados: excertos de "O mostrengo" e "Nevoeiro" de Fernando Pessoa)

O ALMIRANTE NO SEU LABIRINTO

Fevereiro 22, 2025

J.J. Faria Santos

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Corria o mês de Fevereiro (do latim februarius, associado a Fébruo, deus da morte e da purificação) quando Henrique Eduardo Passaláqua (sobrenome italiano que significa pássaro de água, claramente um sinal de predestinação) de Gouveia e Melo decidiu enviar um texto ao Expresso. O jornal acusou a recepção (“do ex-chefe do Estado-Maior da Armada recebemos este artigo”), como quem diz, ninguém lhe pediu nada, ele é que quis enviar, procedendo à respectiva publicação.

 

O almirante entrou à bruta. Escreveu que se situa “politicamente entre o socialismo e a social-democracia”, o que teve dois efeitos imediatos: alienou os votos do Chega, da Iniciativa Liberal, do CDS e da ala do PSD que tem um choque anafiláctico cada vez que ouve a palavra socialismo; e lançou meio ciberespaço numa frenética consulta de ferramentas de inteligência artificial para tentar perceber a diferença entre socialismo (ou socialismo democrático?) e social-democracia. O socialismo do almirante é o do PS ou o do PCP? A social-democracia do almirante é a do PS ou a do PSD? Vá lá que mais à frente esclareceu que “o Estado não deve cair na tentação de conduzir a economia” e que os empresários devem estar “na linha da frente do caminho para a prosperidade”.

 

Gouveia e Melo escreveu que “os partidos políticos são fundamentais para o bom funcionamento da democracia”, mas não consegue evitar tratá-los como se eles tivessem peçonha, razão pela qual o Presidente não pode estar “associado a uma facção política, pois não terá a independência necessária para representar o interesse colectivo”, e tem de funcionar como “um poder-contrapoder de um sistema democrático equilibrado”. A aplicação estrita deste raciocínio conduziria a que jamais qualquer governo eleito fosse encarado como capaz de representar o “interesse colectivo”.

 

O almirante, com o seu perfil disciplinador e amante da ordem (há quem diga autoritário) defendeu, a propósito da liberdade de expressão, que “a democracia tolerante por natureza, não deverá, em defesa própria, permitir ideias e práticas intolerantes”, o que, sendo à primeira vista compreensível, poderá levantar questões relevantes acerca de quem determinará o que são “ideias práticas e intolerantes” (o próprio almirante-presidente?), com os riscos de subjectividade e arbitrariedade.

 

Almejando suceder a Marcelo, o Dissolvente, Gouveia e Melo descarta o chumbo do orçamento como motivo para convocar eleições, mas aventa como motivo para a dissolução do Parlamento um “desfasamento grave entre os objectivos-prática do Governo e a vontade previamente sufragada pelo povo”, ou seja, a quebra de promessas. É certo que ele se refere a um “desfasamento grave”, mas esta condição abre um largo espectro de possibilidades.

 

Num texto em que abordou “os tempos perigosos, com actores poderosos a tentar subverter a ordem mundial em função dos seus interesses”, sintomaticamente ignorou a possibilidade de “morrer para defender a Europa” e a defesa de cortes nas despesas sociais para alavancar o aumento dos gastos militares. Gouveia e Melo é agora um político em construção, o candidato do bloco central de eleitores, que quer ser o candidato de todos os portugueses antes de ser o Presidente de todos os portugueses, à margem dos interesses partidários. E nem falta uma tirada à Gustavo Santos: “É preciso saber sonhar, mas, acima de tudo, é essencial concretizar o sonho.”

 

Imagem: Wikimedia Commons (public domain)

O ALMIRANTE E A SUPERIORIDADE MORAL DOS MILITARES

Fevereiro 16, 2025

J.J. Faria Santos

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Pode ser da farda, do aprumo, do gesto firme e da autoridade imanente. Os portugueses apreciam os militares, a imediata projecção da ordem e de uma certa superioridade moral. Como se, confrontados com os casos de irregularidades e ilegalidades na classe política e nauseados com as minudências do comércio da democracia (como se a arte de governar pudesse escapar ao pragmatismo e decorrer apenas no areópago etéreo dos grandes princípios e das grandes causas), encontrassem na prática castrense um comportamento irrepreensível alheio ao erro e às fraquezas humanas.

 

Basta, porém, recorrer à memória instantânea dos nossos tempos (a Internet), para recolhermos um conjunto de episódios que desmentem esta crença. Temos militares da GNR suspeitos de colaborarem na exploração de jogos de fortuna e azar em bares a troco de remuneração e consumos gratuitos. E temos militares da GNR envolvidos em sequestro e agressão de imigrantes. Em 2022 a Polícia Judiciária Militar dedicou-se a investigar o desvio de géneros alimentícios, e possivelmente combustível, de unidades da Marinha. A mesma PJ desmantelou em 2019 uma rede que desviou 142 000 litros de combustível destinado à Força Aérea (base de Monte Real). 7 militares da Força Aérea terão desviado dinheiro da gestão do Aeródromo de Ovar, entre Outubro de 2018 e Abril de 2021, lesando o Estado em cerca de 288 000 euros. A uma outra escala, e na sequência da Operação Zeus, em Setembro de 2020 23 militares foram condenados no âmbito de um esquema de sobrefacturação  nas messes da Força Aérea e do Hospital das Forças Armadas que lesou o Estado em 1,55 milhões de euros. Por outro lado, a Operação Miríade investigou o tráfico de diamantes, droga e ouro, numa operação liderada por um ex-sargento, que envolveu mais de 60 pessoas, entre os quais militares e agentes da PSP estacionados na República Centro-Africana.

 

O próprio Gouveia e Melo foi censurado pelo Tribunal de Contas por, quando era comandante naval, ter infringido o Código dos Contratos Públicos ao fazer dezenas de ajustes directos ao mesmo fornecedor, bem como outras irregularidades. No que parece ter sido um sério remoque às qualidades de liderança e organizacionais do almirante, o Tribunal de Contas  lembra que, dos “oficiais superiores”, se espera que “emitam as ordens e directivas necessárias, que criem as estruturas adequadas e se rodeiem de pessoal qualificado”. O jornal online Página Um editou em 14/11/2024 um artigo onde revelou que, à data, na Marinha, “a despesa em compras por ajuste directo, em 2024, já ultrapassou os 18,1 milhões de euros, num total de 703 contratos, dos quais 66 acima de 50 mil euros. Só estes últimos atingem, no total, 13,3 milhões de euros. Os ajustes directos serviram para comprar tudo: desde peças para navios até serviços de limpezas, passando até por chouriços e farinheiras. Nos últimos três anos, sob completa responsabilidade de Gouveia e Melo, os ajustes directos em contratos acima de 50 mil euros rondam os 30 milhões de euros.” Justificação? “Urgência imperiosa”.

 

Para o desempenho de qualquer missão ou cargo, mais do que a condição de militar ou civil, o que é relevante é a honorabilidade, o  grau de preparação do candidato e a consistência das ideias e a sua adequação ao sentir da comunidade e aos desafios que se lhe colocam. Gouveia e Melo, por exemplo, pronunciou-se desassombradamente acerca de várias questões. Como encarará o cidadão português a afirmação dele de que “se a Europa for atacada e a NATO nos exigir, vamos morrer onde tivermos de morrer para a defender”? E concordará com o almirante quando ele afirma que “de alguma forma vai haver afectação das despesas sociais. O que interessa termos despesas sociais se não tivermos país?”

A FEIRA DA VAIDADE

Janeiro 12, 2025

J.J. Faria Santos

Gouveia_e_Melo_setembro_2015.jpg

Se Los Angeles se vê a braços com os ventos de Santa Ana, já a Figueira da Foz é palco para o sopro de Santana. Com laivos de despeito, mas sobretudo de incompreensão, em declarações ao Público, Santana Lopes lamenta que o PSD prefira apoiar nas presidenciais Marques Mendes, alguém com um currículo que não tem “comparação” com o seu e pode fazer um cargo “benzinho”, mas que não “desperta o mínimo de entusiasmo nas pessoas”. É verdade que as sondagens não têm sido famosas, que a recepção no congresso do PSD não foi entusiasmante e que o presidente não-executivo do Goldman Sachs International anda por aí. Durão Barroso, aliás, defendeu em artigo publicado na revista da Chatham House (editado agora pelo Expresso), que os “líderes centristas, seja à esquerda ou à direita”, têm de “recalibrar” o seu discurso no que se refere às “questões de segurança pública, aumento da criminalidade e imigração ilegal”, de forma a responder a “preocupações públicas legítimas” de eleitores que, doutra maneira, poderão ser atraídos por “forças mais extremadas”. Um discurso sibilino que se adequa à estratégia “não é não, porém, as percepções” do primeiro-ministro português. E se Montenegro achar que Marques Mendes é “poucochinho” e que um Barroso com um currículo recheado e um discurso que o ar do tempo pede tem mais hipóteses de vitória? É certo que ele já se pôs fora da corrida, mas se houver um apelo patriótico, não será suficiente para o demover? É que se há algo que mova Durão Barroso é precisamente o patriotismo.

 

À esquerda António José Seguro ocupou terreno, com “oito metas e objectivos” para colocar Portugal “na vanguarda dos países mais desenvolvidos”, com um apelo ao diálogo e à moderação, lamentando a escassez de uma “perspectiva prospectiva”. Assume-se como “social-democrata”, mas acha “que a social-democracia está morta nas suas propostas”, e avançou com uma “sugestão” de que o Orçamento do Estado deixasse de ser votado, o que suscitou reacções violentas por parte de correligionários. Seguro tem um problema: se transmite, é certo, uma imagem de seriedade e ponderação, também não é menos verdade que projecta um certo ar de pusilanimidade e, à semelhança de Marques Mendes, não entusiasma. Se é para apostar na moderação, no talento para estabelecer pontes e na capacidade “prospectiva”, António Vitorino tem melhores qualidades e consistência doutrinária. E Mário Centeno terá uma melhor ideia do país que poderemos vir a ser, mais assente nas circunstâncias do presente e menos em proclamações ambiciosas sem ponto de contacto com a realidade.

 

Quanto ao campeão das sondagens, foi de férias agradecendo a “confiança dos portugueses”. Gouveia e Melo parece despertar nestes convicções ancestrais associadas à instituição militar enquanto formadora cívica de homens e, ao mesmo tempo, de garantia da ordem e do respeito. É sobretudo disto que se compõe o carisma do novo almirante sem medo, reluzente na sua imagem que aglutina o compagnon de route de D. João II, o Capitão Iglo e o Dirty Harry. É muito pouco, mas pode bastar. Os portugueses adoram personalidades fortes e austeras. Suportaram durante quase meio século um ditador provinciano e beato de voz aflautada. Poderão, seguramente, eleger democraticamente um almirante de voz grossa e ego robusto. Se Donald Trump depois de invadir a Gronelândia quiser anexar os Açores, quem melhor do que Gouveia e Melo para lhe fazer frente?

 

Imagem: Gouveia e Melo fotografado em Setembro de 2015

O BROMANCE DOS MELOS

Novembro 24, 2024

J.J. Faria Santos

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Esta semana a actualidade ficou marcada pela Convenção dos Melos, evento que teve lugar pela calada da noite num bar lisboeta. As fotografias divulgadas em modo de flagrante delito exibem um clima de bromance entre o líder do CDS e/ou ministro da Defesa e o almirante presidenciável e/ou chefe de Estado-Maior da Armada. Apesar da informalidade, o encontro deve ter tido um propósito, dado que é sabido que o Melo almirante não é particularmente dedicado ao convívio de lazer com entidades políticas, característica que poderá ser simbolizada pela sua célebre frase “colinho dá a mãe em casa”.

 

Aparentemente, Gouveia e Melo e Nuno Melo ter-se-ão contentado em agitar as águas. Raquel Abecasis cita no jornal I um “apoiante da candidatura” do almirante que considera que “ele ganha em não ter o apoio formal de partidos”, e escreve que um eventual apoio formal do CDS “é duvidoso até porque Paulo Portas não vê a hipótese com bons olhos”. Abecasis escreve também que o ministro da Defesa “tem sido muito pressionado por Marcelo Rebelo de Sousa e por Luís Montenegro para acelerar (…) [a] recondução do almirante das vacinas, de forma a evitar uma cada vez mais provável candidatura”. Considerando a veracidade desta última revelação, percebe-se o potencial de galhofa do nightcap no Cockpit destes machos alfa.

 

As presidenciais são em 2026 e os candidatos ainda não estão todos alinhados. Para já, o perfil messiânico do almirante garante-lhe o primeiro lugar nas sondagens, apesar de já ter declarado que “qualquer ser que apareça como salvador da pátria é mau para a democracia. (…) Não é uma personagem que salva a democracia. Isso cheira a outra coisa. Eu não quero ser essa pessoa”. A últimas notícias apontam para a indisponibilidade do almirante para ser reconduzido no cargo que desempenha actualmente e para o anúncio no próximo mês de Março da candidatura a Belém. As mesmas sondagens atribuem ao remake de Marcelo (o comentador “independente” Marques Mendes, que ansiava por uma saudação apoteótica no congresso do PSD que não se materializou) cerca de metade das intenções de voto de Gouveia e Melo. Em próximos estudos veremos a cotação do mais recente candidato a candidato, António José Seguro, que, dez anos depois, regressa com a sua celebrada moderação, a sua reconhecida simpatia, a sua verve reticente e o seu carisma oculto, preocupado com “um Estado a abrir fendas” e uma “sociedade a deslassar”.

 

Imagem: paginaum.pt

O NOVO HOMEM DO LEME

Março 19, 2023

J.J. Faria Santos

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“Aqui ao leme sou mais do que eu: / Sou um povo que quer o mar que é teu”, dirá Gouveia e Melo ao “mostrengo”, que nada mais poderá ser que o fantasma de letargia, fraqueza e desorganização que nos tolhe enquanto nação. Depois de ter comandado a inoculação contra a covid-19, eis que se vê confrontado com o vírus da indisciplina no seu core business, frisando que “a disciplina não é, nem nunca será, um mero acto de submissão, mas sim de um verdadeiro autocontrolo e entrega”.

Se atentarmos na fita do tempo dos acontecimentos, verificámos que tivemos direito a uma alusão cinematográfica (Revolta na Bounty) e à flagelação pública dos insubordinados (com nova referência hollywoodesca: a Marinha não envia “navios e guarnições para missões impossíveis”), acabando o almirante por derivar para umas insólitas considerações de teor político.

 

É tendo em conta este último aspecto que não podemos deixar de concluir que Gouveia e Melo parece ter perdido a noção da “disciplina como autocontrolo”. «Parece-me que muitas motivações para o circo que se instalou à volta deste caso, apesar da sua gravidade, não têm unicamente a ver com este facto mas são por causa da popularidade que me tem sido atribuída», disse o Chefe da Armada ao Nascer do Sol, numa tirada a leste das suas funções e indiciadora de que os seus interesses privados possam colidir com o exercício de um cargo na Marinha em que convém que a firmeza e a competência andem de braço dado com a discrição, e a ambição pessoal seja subalternizada ao bem comum.

Num artigo particularmente cáustico, intitulado “Ambição sem princípios”, Pacheco Pereira escreveu no Público que se “o almirante vai continuar a usar o cargo para promover ou defender a sua candidatura presidencial, devia abandonar as funções ou ser demitido por alguém”. Bem vistas as coisas, a narrativa de que o PCP terá estado por detrás do movimento dos 13 militares vem alimentar uma conjuntura política em que o adjectivo comunista tem sido arremessado com assinalável leviandade, e pode ser mais uma medalha  no peito do putativo candidato outsider da direita.

 

Ao Nascer do Sol, o major-general Carlos Chaves declarou que o almirante é visto por muitos na classe política como “um homem a abater”, afiançando que ele “mete medo a muita gente”, sobretudo políticos que “vêm de carreiras partidárias, familiares, mafiosas, e que sabem que com ele num lugar de responsabilidade há muita coisa que acabaria”. Eis, em todo o seu “tenebroso esplendor”, o retrato do impoluto homem providencial pronto para limpar o país da corja nepotista e incompetente. Rodeado por esta aura populista e militarista, que sabemos do pensamento e das ideias políticas deste novo almirante sem medo? Sim, porque um Presidente é um actor político, não é um candidato a salvador da pátria com uma auto-estima exacerbada e um sentido agudo de disciplina. Não lhe basta murmurar uns versos de Pessoa: “Meu pensamento é um rio subterrâneo / Para que terras vai e donde vem?”

 

Imagem: www.defesa.gov.pt

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