SILLY SEASON À LUZ DE AGOSTO
Agosto 07, 2022
J.J. Faria Santos
Parece que o árbitro do interesse público não pode exercer o seu poder moderador e exibir um cartão amarelo ao presidente de um grande player do sector da energia (que, inopinadamente, anunciou o aumento colossal na factura de electricidade, logo desmentido pela empresa em comunicado), sem que isso seja interpretado pelas forças amigas das empresas e da livre iniciativa como o prenúncio da caminhada para o estatismo chavista. Na verdade, António Costa, no seu despacho, limitou-se a destacar a necessidade de proteger os consumidores de “ameaças de práticas especulativas”, a frisar a necessidade de gerir bem “os dinheiros públicos” e a lembrar que há outros prestadores e serviços no mercado. Houve quem sugerisse o recurso ao VAR (também conhecido como o nosso senhor dos avisos e dos recados), mas Marcelo limitou-se a pedir “bom senso” e “responsabilidade social” às empresas.
Largado com estrondo o pronunciamento do Sr. 40%, publicado com brutalidade o despacho da discórdia (desrespeitoso para as primas-donas da economia de mercado, habituadas a salamaleques untuosos, subsídios a fundo perdido e amizades recíprocas com salvos-condutos para portas giratórias), eis que comentadores indignados e políticos empenhados em transformar a “piolheira” num farol do liberalismo se apressaram a denunciar a prepotência, a ameaça e a retaliação. Marcelo não convocou o Conselho de Estado, a Endesa tranquilizou os seus clientes e Portugal prosseguiu indiferente à bolha mediática da política, atenção dividida entre o astronauta Mário Ferreira (que foi ao espaço durante 10 minutos), o melhor jogador do mundo, CR7, agora entretido a desfazer a sua imagem de profissionalismo, e o apelo da praia e do mar. Isto enquanto o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, apelidou de “imoral que as petrolíferas e as empresas de gás estejam a fazer lucros recordes a partir da crise energética e graças às comunidades mais pobres, com um custo enorme para o clima”.