O VICE-COMENTADOR-EM-CHEFE A CAMINHO DE BELÉM?
Setembro 03, 2023
J.J. Faria Santos
Após décadas de carreira política seguidas de largos anos de carreira política continuada por outros meios (audiovisuais), seguindo o template do actual PR, Marques Mendes anunciou em horário nobre a sua pré-candidatura à Presidência da República. A notícia foi de tal forma inesperada que um outro pré-candidato, Santana Lopes, comentou: “E como a pescada. Antes de ser já o era”.
Marques Mendes condiciona o seu avanço à utilidade do gesto. É possível que o próprio PSD ache mais útil o seu desempenho de comentador “independente”, tarefa durante a qual, e citando Miguel Sousa Tavares no Expresso, “teve sempre a cautela de nunca se afastar do partido quando não era conveniente e de fazer soar as trombetas da imprensa amiga para que notassem que discordava do partido quando tal era inócuo”. O herdeiro de Marcelo nas conversas em família em versão democrática (que agora se prepara para fazer nova habilitação de herdeiros com o foco em Belém) prosseguiu o legado, com menos humor e sofisticação (embora mantendo os gestos largos e uma vivacidade algo artificial), mas é justo reconhecer que inovou nas cachas jornalísticas. É certo que deu alguns passos em falso, mas nunca anunciou, ao contrário do actual inquilino de Belém, a morte de uma pessoa que insubordinadamente teimou em manter-se viva.
Em entrevista ao Observador em Agosto de 2016, o protocandidato descrevia-se como alguém “viciado em política”, assumia-se como um “animal político” e admitia que em 2024 pensaria em candidatar-se a PR (antecipou o calendário, talvez para marcar terreno). Interrogado acerca do início da sua carreira na comunicação social, no caso em funções governativas em que granjeou a fama de telefonar para a RTP e fazer o alinhamento dos Telejornais, respondeu nada ter a “confessar”, não sem antes ter afirmado: “Não vou dizer que nunca falei para a RTP. Agora, houve uma mudança grande. Seguramente que todos os governantes têm nesse domínio os seus pecados ou pecadilhos.”
Tal como Marcelo, Marques Mendes tem uma ligação ao mar - um é mais mergulhos e o outro era devoto do bodyboard -, mas falta-lhe gravitas, grandeza (não é piada) e, sobretudo, propósito. A política não pode ser só um vício nem se comprazer no anúncio de virtudes retóricas. Que grande desígnio para a nação, que projecto mobilizador, que capacidade de criar sinergias se poderá adivinhar na futura candidatura a Belém do vice-comentador-em-chefe?
Na resposta a um inquérito de Verão do Diário de Notícias em Agosto de 2014, quando questionado se ao ser fotografado por um paparazzo preferiria “aparecer na capa de frente ou de costas”, Marques Mendes respondeu: “Nu numa praia? Eu? Absolutamente impossível. Comigo o paparazzo não tem grande sucesso”. É provável que comentador vá nu e que lhe digam que ele vai engalanado com um sumptuoso atavio que só os inteligentes conseguem ver.
Imagem: Marques Mendes em 1975 (pormenor de foto publicada em observador.pt)