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NO VAGAR DA PENUMBRA

NO VAGAR DA PENUMBRA

25 DE ABRIL SEMPRE! MARCELO NUNCA MAIS!

Abril 28, 2024

J.J. Faria Santos

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A 25 de Abril, diz o insuspeito Pacheco Pereira, o povo saiu à rua para exprimir e combater o “receio sobre a liberdade e a democracia que a actual situação política parece justificar”. Ou seja, confrontado com a “ascensão do Chega” e sem “entusiasmo pela mudança governativa em si”, a esquerda manifestou na rua que estava atenta e vigilante perante os sinais de contra-revolução que uma ofensiva conservadora, por um lado, e populista, pelo outro, parecem encetar.

 

O quinquagésimo aniversário da revolução dos cravos dá-se com um Parlamento fragmentado, com uma direita maioritária à mercê dos humores de um líder radical panfletário, com um primeiro-ministro cujo estilo oscila entre o discurso sinuoso e ambíguo, o silêncio e o voluntarismo sem sustentação, com o principal líder da oposição a tentar conciliar o “common ground” com o combate político incisivo, e com a Justiça em turbulência com uma PGR desacreditada. Houve quem tivesse a ilusão de que o Presidente da República seria o factor agregador, uma garantia de serenidade e bom senso, o que se veio a revelar um enorme erro de julgamento.

 

O episódio com jornalistas estrangeiros parece ter-se inspirado no tradicional jantar com os correspondentes da Casa Branca. Só que, fazendo jus à sua versatilidade, Marcelo não se ficou pelo arremedo de stand-up comedy, avançando pelos terrenos da soap opera, do thriller psicológico e da intriga internacional. Com traços de egomaníaco, um indisfarçável sentido de entitlement e tiques de autoritarismo que a exibição do afecto procura disfarçar, o PR avança incontrolável com um propósito em mente: a recuperação da sua popularidade. “Já estou com quase 60% de aprovação”, frisou no infame jantar.

 

O país é um acessório, a instabilidade um efeito colateral, as dificuldades de adaptação ao novo primeiro-ministro um desafio estimulante. Versado nas artes do jornalismo, para Marcelo o jantar funcionou como uma espécie de explicador. Que ele se possa sentir incompreendido, é apenas uma suave ironia. Ou o pretexto para o controlo de danos, que ele tentou fazer nos dias imediatos, e que incluiu uma flagrante inverdade. Talvez ele seja um crente na máxima de Oscar Wilde: “Nada é verdade, excepto a paixão. O intelecto nada tem de verdadeiro e nunca o teve. É um instrumento com o qual se opera, nada mais.”

ABRIL EM PORTUGAL

Abril 24, 2022

J.J. Faria Santos

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Era o Estado Novo. “Sim, isto é um Estado Novo / Pois é um estado de coisas / Que nunca se viu”, sentenciou Fernando Pessoa em 1935. E prosseguia: “Em tudo paira a alegria / E, de tão íntima que é, / Como Deus na teologia / Ela existe em toda a parte / E em parte alguma se vê.” Era, pois, um regime sombrio, mesquinho e castrador, dirigido por um “cadáver emotivo, artificialmente galvanizado por uma propaganda”, Salazar, de quem o poeta diz que “bebe a verdade / E a liberdade, / E com tal agrado / Que já começam / A escassear no mercado.”

 

Já não foi Salazar a ser deposto (apesar da simbólica fotografia em que um soldado retira da parede o quadro do ditador). Foi Marcello Caetano que foi evacuado num blindado para o Quartel da Pontinha, debaixo dos apupos da população. Era o corte definitivo com um modo de vida onde, citando o historiador António Reis, “rara era a família que não tinha alguém a combater em Africa, o serviço militar durava quatro anos, a expressão pública de opiniões contra o regime e contra a guerra era severamente reprimida pelos aparelhos censório e policial, os partidos e os movimentos políticos se encontravam proibidos, as prisões políticas cheias, os líderes oposicionistas exilados, os sindicatos fortemente controlados, a greve interdita, o despedimento facilitado, a vida cultural apertadamente vigiada”.

 

Com o 25de Abril de 1974 desapareceu um regime que depois do adeus não deixou saudades, apesar de ter deixado saudosistas. E abriram-se novos horizontes, sem fronteiras físicas nem constrangimentos mentais ou culturais, para um povo que se apropriou da liberdade e jamais prescindiu dela. E o povo é quem mais ordena, mesmo (ou sobretudo) quando escolhe a desordem.

 

Imagem: www.cd25a.uc.pt

A LIBERDADE É LIBERAL

Abril 24, 2021

J.J. Faria Santos

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Houve uma altura em que a direita era de confiança e mesmo quando não hostilizava o 25 de Abril mantinha uma distância profiláctica. É certo que alguns bravos ainda resistem, como Alberto Gonçalves, colunista “premium” do Observador: “Quero que eles peguem no cortejo, que além de ideologicamente repulsivo é uma foleirada estética, e o levem para longe, onde eu não tenha de ver os cravos nas lapelas ou ouvir as Grândolas da praxe.”  Para o facto de celebrar o advento da democracia e da liberdade lhe parecer repulsivo, não tenho remédio, mas quanto à “foleirada estética”, proponho que pondere a elevação à categoria de kitsch e talvez não lhe pareça tão intragável. Este intróito em tom irónico serve para realçar que, lamentavelmente para o compungido articulista “premium”, há uma direita que diz que o 25 de Abril “é o dia em que foi derrubada uma longa ditadura” e que “nenhuma das liberdades pelas quais os liberais ainda hoje lutam existia antes” dessa data. Por isso, explica Cotrim de Figueiredo, a Iniciativa Liberal “sempre participou, com alegria e convicção, em todos os desfiles que tiveram lugar na Avenida da Liberdade” (in Expresso).

 

A “alegria” da IL ficou toldada com a recusa inicial da Comissão Promotora das comemorações em incluir este partido, o que levou a acusações de sectarismo, por um lado, e de provocação gratuita, por outro. Posteriormente, a polémica amainou e o bom senso prevaleceu, embora o partido liderado por Cotrim de Figueiredo não tenha prescindido do seu próprio desfile. Claramente, não sente que ele seja uma agressão estética, “uma foleirada”, e tendo em conta o seu acervo de cartazes bem-humorados, eu diria que a IL se move bem nos domínios do agitprop. Além do mais, deve sentir que está a quebrar o monopólio da esquerda no mercado das comemorações, o que constitui um estímulo extra. Quezílias à parte, celebremos, pois, a liberdade em toda a sua inteireza e diversidade. Porque a liberdade é liberal: é generosa e tem largueza de espírito, abomina exclusões e só convoca o radical como símbolo do que é essencial e profundo, nunca como fautor da intransigência.

 

Imagem: cd25a.uc.pt

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