SILLY SEASON: DA RAQUEL RADICAL À ASSUNÇÃO DESBOCADA
Agosto 27, 2019
J.J. Faria Santos
O SIS estará de prevenção, atento a actos que possam “alterar ou destruir o Estado de Direito”. A Brigada de Minas e Armadilhas está a postos. E tudo graças à coragem e ao desassombro de Raquel Abecasis, que acaba de denunciar no jornal Público que foi apresentado ao país um “cocktail explosive”. Afiança ela que “o que está prontinho a explodir é a nossa sociedade”, que a ideia subjacente ao despacho governamental 7247/2019 (que pretende assegurar a correcta integração e a privacidade de jovens transgénero em ambiente escolar) “é mesmo acabar com todas as bases da nossa sociedade”. Pouco importa que o despacho determine princípios gerais e dê liberdade de acção às escolas, ou que os directores destas e as associações de pais não demonstrem qualquer apreensão. O arsenal argumentativo de Raquel Abecasis provém da convicção arreigada (que parece desdenhar factos e alimentar-se de dogmas), com origem nos mesmos quadrantes ideológicos que viam na liberalização do aborto ao mesmo tempo uma chacina de inocentes e um livre-trânsito para a licenciosidade, e na introdução de conteúdos de educação sexual na escola o princípio da transformação dos estabelecimentos educativos em cenários de filmes para adultos. No fundo aquilo que o líder da Juventude Popular, Francisco Rodrigues do Santos, chama de “hipersexualização dos jovens” promovida por uma “ideologia de género”. Quando o combate político dispensa a racionalidade, perde o sentido das proporções e aposta no alarmismo o resultado é penoso para os seus promotores.
Num artigo de Vítor Matos no Observador em Março de 2018, onde se comparava o estilo de liderança de Paulo Portas com o de Assunção Cristas, concluía-se que esta última, no Parlamento, “em vez da oratória, recorr[ia] a outro trunfo: a agressividade”. E de facto, a líder do CDS foi acusando sucessivamente o primeiro-ministro de mentir e ser incompetente, de não ter honestidade política nem frontalidade. Até que vieram as eleições europeias. Aturdida pelo resultado, suavizou o discurso e solicitou conselhos de coiffure. Só que, como Freud explicou, as emoções não expressas nunca morrem e evoluem mais tarde para formas mais radicais ou menos polidas. Que se manifestam mesmo no interior da própria família política. Acossada num conselho nacional do CDS por Luís Gagliardini Graça, opositor interno membro da Tendência Esperança em Movimento, a líder do partido tê-lo-á mandado “lamber sabão”. Que é como quem diz: “não me chateies”, “vai pentear macacos”, “desampara-me a loja” ou “vai ver se eu estou na esquina”. Resta saber se Assunção Cristas, que deve ter visto a sua íntima esperança em movimento (fugindo a sete pés dela), terá assumido nesta invectivação uma formulação próxima da linguagem dos bairros sociais que ela visita de botas e calças de ganga (“Oh Luís, estás a ouvir? Vai mas é lamber sabão!”), ou se manteve um estilo mais próximo do vestido frutado e do stiletto (“Ouça, não seja caturra. Sabe que mais? Vá lamber sabão. Vegetal, antibacteriano, hidratante, antisséptico ou neutro. Sólido ou líquido, em pó ou em creme, escolha o menino!”)