REFLEXÕES SOB O SIGNO DE AGUSTINA
Maio 17, 2025
J.J. Faria Santos
“Iludir um povo é um crime; desiludi-lo é um erro”, escreveu Agustina Bessa-Luís. Talvez seja este o destino fatal da democracia e dos seus protagonistas, vassalos da lei e do Estado de direito, senhores de convicções, escravos dos meios de persuasão e reféns da construção de uma reputação que garanta o acesso ao poder. “Não é a lei que faz a reputação dum homem; a lei faz a decência, mas não a honestidade”, aventou Agustina. É a diferença entre a compostura e a probidade.
A maneira como Agustina retratou aquilo que se convencionou chamar de polarização foi a seguinte: “Os políticos nunca têm humor e agem dentro do princípio da sua razão e da desrazão dos outros.” E ninguém melhor para ilustrar esta premissa do que os políticos que se auto-excluem desta categoria, que se elevam ao lugar etéreo da depuração, a tecnocracia. Ora o tecnocrata, defende a escritora, “degrada o governo, porque conclui que ele deve imobilizar o espírito” e tem “um desprezo inveterado por tudo o que não seja um resultado numérico”.
Em dia de reflexão, o Presidente da República explicou que o mundo mudou por causa de Trump, que não votar seria “meter a cabeça na areia” e que, pelo contrário, votar é “contribuir para a estabilidade”. Ignoremos o “óbvio ululante” de ele ter sido o maior factor de instabilidade dos últimos anos, feito talvez explicável pela aplicação a contrario da máxima de Agustina que postula que “a mediocridade dos chefes faz a estabilidade dos Estados”. E para os que desesperam com a suposta degradação da qualidade da classe política, resta apostar no “talvez” que a nativa de Amarante colocou nesta frase: “Em toda a criatura humana há talvez a impossibilidade do invulgar”. Talvez não haja. Talvez haja a possibilidade da superação, da transcendência.