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NO VAGAR DA PENUMBRA

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O REGRESSO DA GUERRA FRIA

Setembro 03, 2014

J.J. Faria Santos

Numa altura em que se evoca o centenário da eclosão da 1ª Grande Guerra, e se rememoram as causas que contribuíram para o rol de mais de oito milhões de mortos e cerca de vinte milhões de feridos, os senhores do mundo parecem de novo entretidos em escaladas retóricas, manobras de rearmamento e violações de soberania, enquanto que uma organização terrorista bem financiada e com assinalável capacidade militar espalha o seu credo jihadista e se dedica a conquistar território.

Agustina Bessa-Luís escreveu que “nas guerras só se conhece uma parcela da realidade. Para uns é uma causa ideológica, para outros uma crise económica, uma vingança que transborda do inconsciente ou uma maneira simplista de discutir verdades”. Qualquer uma destas causas poderá estar por trás do interminável conflito israelo-palestiniano (acerca do qual Karl Vick escreve na Time que “na ausência de objectivos alcançáveis, apenas a exaustão poderá forçar ambas as partes a interromper o hábito da guerra”); ou da guerra por procuração que o Irão e a Arábia Saudita alimentam na Síria, no Líbano ou no Iraque; ou ainda do aumento dos gastos militares no Japão, contemplados no orçamento para 2015, um recorde absoluto de 36,9 mil milhões num contexto de disputas territoriais com a China embebidas numa retórica nacionalista.

Já não bastava o facto do Estado Islâmico se estar, nas palavras de Joe Klein na Time, a ”metastizar e a cometer atrocidades em massa com uma ferocidade espantosa”; tinha que vir Vladimir Putin colocar a cereja no topo do bolo ao invadir ilegalmente a fronteira ucraniana de forma a consolidar o seu impulso de desestabilização de uma nação soberana. Pior: fez regressar a retórica da Guerra Fria. “Estamos a fortalecer o nosso poder de dissuasão nuclear”, disse; “os nossos parceiros têm sempre de perceber que é melhor não se meterem com a Rússia”, acrescentou. Apetece perguntar: e a Rússia? Não tem de perceber que é melhor não se meter com os seus parceiros?

Sucede que talvez o Presidente russo aproveite para exercitar o seu belicismo em nome da recuperação da grandeza da Rússia numa altura em que, porventura ilusoriamente, percepciona uma miríade de fraquezas: de Obama, visto por 54% dos americanos, de acordo com uma sondagem da Pew, como não “suficientemente duro” em política externa e segurança nacional, e da União Europeia, avessa ao incremento de gastos militares, a braços com a ressaca da Grande Recessão e condicionada politicamente pelos interesses comerciais que vários dos países que a integram desenvolveram com a pátria de Putin.

Agustina também escreveu: “a revolução precisa de convicções; a guerra precisa de circunstâncias”. O mundo, acrescentaria eu, também precisa de homens à altura dessas circunstâncias. Que sejam capazes de as desarmar e neutralizar.

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