O ESPLENDOR DE PORTUGAL
Julho 11, 2016
J.J. Faria Santos
Houve momentos de puro aborrecimento. Em que desviei os olhos do ecrã, do profissionalismo e do empenho imaculados da selecção nacional, e dediquei a minha atenção aos contos de Lucia Berlin. Nesses instantes, desprezei a emoção do directo, consciente, porém, de que um replay me permitiria aceder ao sublime. Como sempre, julgo que Portugal encontrou no menosprezo e na subvalorização de que foi alvo, explicita ou implicitamente, uma dose extra de motivação. Por transitório que seja, deleitemo-nos com o facto de dominarmos esta Europa. As circunstâncias da infelicidade individual potenciaram a gesta colectiva. Demos uma lição de perseverança, técnica e táctica. O nosso pacto de estabilidade e crescimento assentou na contenção como prólogo do assalto. Não alinhámos no galope sôfrego, trotamos ora com segurança utilitária ora com brilho artístico. Poderão sempre dizer que ganhámos acima das nossas possibilidades. Será um erro. Ganhámos porque nos recusámos a acreditar no impossível. Eis o que explica la grandeur d’un petit pays.
É sempre com redobrada emoção (a roçar o júbilo) que assisto à ascensão de gradas figuras da pátria ao topo de instituições financeiras internacionais de prestígio. É o caso agora da contratação de Durão Barroso para presidente não-executivo da Goldman Sachs International. O ex-presidente da Comissão Europeia explicou ao Expresso que a crise de 2008 lhe deu experiência e independência na área da regulação financeira. Ora, a ser assim, Barroso vai ser de uma utilidade extrema para a família Goldman Sachs, instituição que no passado mês de Abril acordou com o Departamento de Justiça americano o pagamento de uma multa de 5,06 mil milhões de dólares, destinada a resolver as queixas de investidores que teriam sido enganados na aquisição de títulos de crédito hipotecários. Além do mais, sensibiliza-me o sacrifício do José Manuel. É que, como ele confessou ao Expresso, certamente inspirado pelo cenário de Princeton, do que ele gosta “é da arte, é da literatura, é do teatro, é da música, é das artes plásticas”. Porque “os políticos passam. Aquilo que fica é um Shakespeare, um Camões, um Cervantes, um Montaigne ou um Dante”. Como lhe deve parecer desmotivante a tarefa do CEO da Goldman Sachs, Lloyd Blankfein, que diz, apenas, “que faz o trabalho de Deus”.
Enquanto Cristiano Ronaldo tomou a atitude higiénica de arremessar o microfone do Correio da Manhã para um lago, o Presidente-Rei, o provedor dos afectos, o “picareta falante” versão século XXI ligou para o jornal descontente com um artigo relacionado com a utilização de um Falcon da Força Aérea. Uma notícia que num dia aludia a um custo de 14 000 euros para o erário público, logo se transformou num gasto de 600 euros suportado pelo próprio Marcelo. (Alto lá! Telefonou a reclamar? Mas isto não será condicionar a liberdade de imprensa? Uma forma subtil de intimidação? Claro que não! Foi tudo feito, certamente, com afecto. E ele até conhece o métier…). Nada disto tem relevância. O que nos enche de orgulho é que graças a ele a política lusa segue as melhores tendências da política americana. Se Donald Trump, acicatado por uma menção de Marco Rubio às suas “mãos pequenas”, logo tratou de insinuar que o símbolo da sua masculinidade tinha o tamanho adequado, Marcelo Rebelo de Sousa proclamou urbi et orbi que o cogumelo da Presidência é maior que o do Governo. Dizem que o tamanho (do ego, claro) não importa, que o desempenho é que é fulcral. E nisso ele tem sido exímio, no papel do salvador que desceu da televisão para nos salvar