MOEDAS - EAU DE PARFUM
Outubro 24, 2021
J.J. Faria Santos
Inebriados pelo novo flautista de Lisboa, os senadores da direita, liderando os correligionários, acorreram pressurosos à tomada de posse do alcaide. Não se poderá dizer que “foi bonita a festa, pá!” (expressão plebeia e esquerdista), ou que foi “chique a valer” (queirosianamente démodé). Terá sido, sei lá, amorosa, fantástica.
Não faltaram os comentadores do regime, ex-líderes dos respectivos partidos, que peroram aos domingos em canal aberto, assessorados por jornalistas que fazem de ponto ou de mestres de cerimónia. (O contraditório em espaços de opinião assinados é só para os políticos irascíveis.) Não faltou o ex-Presidente, especialista em artigos politicamente orientados disfarçados de ensaios de economia política. Não faltou o ex-primeiro-ministro, espoliado do costismo, D. Sebastião emérito, avaro nas aparições mas cirúrgico nas intenções. Não faltaram os contendores da guerra do trono: o barroco e incisivo Rangel e o abrasivo e acossado Rio. E figuras avulsas, de mérito variado, que abandonaram por algumas horas as suas empresas, fundações ou instituições financeiras para celebrar o que julgam ser o momento fundador do renascimento da direita. Todos eles se encharcaram de Moedas, o novo perfume do poder, com notas vibrantes e um toque cosmopolita, ainda para mais agora que a esquerda se compraz na divisão e no cálculo.
Houve quem notasse um certo odor a bafio. Nada que um vigoroso arejamento e um generoso aspergir de um fougère clássico não dissipe, julgam eles. Como se o passado fosse um país estrangeiro e a memória uma excentricidade dos ressentidos. Melhor será que celebremos todos a soberania do voto popular, as virtudes do Estado de direito e a importância da alternância democrática. Para depois podermos livremente dizer, como José Régio: “Não sei por onde vou, / Não sei para onde vou, /- Sei que não vou por aí!”
IMAGEM: António Cotrim/Lusa (tsf.pt)