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NO VAGAR DA PENUMBRA

NO VAGAR DA PENUMBRA

JOSÉ GOMES FERREIRA DERRETENDO A CREDIBILIDADE

Agosto 15, 2021

J.J. Faria Santos

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Ao contrário do que se possa pensar, o problema de José Gomes Ferreira não reside na forma directa e veemente com que expressa a sua opinião. Nem que esta transmita um evidente enviesamento político-ideológico. Nem sequer que ele apresente as suas legítimas interpretações dos factos como fotografias da realidade imunes ao filtro da sua visão do mundo. O problema de José Gomes Ferreira é o da credibilidade em fuga, graças à voracidade com que vai alargando os domínios da sua intervenção pública (primeiro, restrita à área da economia, com derivações para a análise política, agora estendendo-se à História, à astronomia e às alterações climáticas), alicerçando as suas quase sempre bombásticas conclusões (que não raramente contrariam o consenso científico e as teses consolidadas) em fontes inexistentes, duvidosas ou descredibilizadas.

 

O programa Negócios da Semana sempre me pareceu (pela amostra de algumas edições que vi e que me desencorajaram de ser espectador assíduo) uma espécie de clube de mentes alinhadas, em que os participantes eram convidados pelo apresentador com a convicção de que eles iriam reforçar a difusão do ponto de vista que aquele, a priori, já tinha consolidado. Aqui e ali, um desalinhado era alistado para dar a aparência de pluralidade e contraditório, arriscando-se a ser trucidado caso se deixasse condicionar pelo estilo jornalista-corajoso-que-sabe-mais-do-que-o-que-pode-dizer (mas que não cede a pressões) de Gomes Ferreira.

 

É certo que não se pode dizer que o jornalista fuja ao confronto, dispense a polémica ou tema contrariar um convidado. Lamentavelmente para ele, muitas vezes o resultado é que Gomes Ferreira veicule patentes disparates, como quando nos desafiou a não acreditar na “cor vermelha ou castanha de Marte” (asserção que Miguel Gonçalves, comentador de astronomia da RTP, definiu como um “atentado à ciência” e um “crime de desinformação”). Ou ainda a forma como desvalorizou o aquecimento global, tecendo considerações sem base científica (defendendo que o “deslocamento dos pólos magnéticos” pode ter influência nas alterações climáticas, ou negando o degelo da Antártida, dado que “enquanto derrete de um lado, acumula do outro”).

 

É provável que o grupo de comunicação social onde exerce actividade aprecie o seu estilo desassombrado (que confere sempre uma aura de feroz independência e uma espécie de selo de contrapoder), tolerando os seus passos em falso como uma família conservadora tolera os deslizes de um estouvado jovem adulto. Isto enquanto José Gomes Ferreira vai, neste caso de forma verídica, vivendo a sua Antártida: derretendo a credibilidade e acumulando ignorância.

 

Imagem: Notícias TV/Diário de Notícias

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