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NO VAGAR DA PENUMBRA

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FAMILYGATE - CONTRIBUTOS PARA A CAVACOLOGIA

Abril 08, 2019

J.J. Faria Santos

 

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O supra-sumo da gestão dos silêncios regressou à arena mediática com estrondo. Inadvertidamente, acabou por confirmar a sugestão do actual primeiro-ministro de que ele tem uma relação problemática ou selectiva com a memória. “Fui verificar a composição dos meus três governos durante os dez anos em que fui primeiro-ministro e não detectei lá – espero não me ter enganado – nenhuma ligação familiar.”, disse Cavaco Silva. Não obstante a surpreendente modéstia (a simples admissão da possibilidade de ter laborado num equívoco é assombrosa), o teor da proclamação é devastadoramente errónea. Sobretudo para alguém que sempre reclamou para si as qualidades inerentes ao estudo minucioso dos assuntos e ao rigor das afirmações.

 

Uma outra declaração, também na linha da neomodéstia, ajudará a explicar o faux pas. Disse ele: “Nos últimos dias aprendi bastante sobre as relações familiares entre membros do Governo e confesso que era bastante ignorante em relação a quase tudo daquilo que foi revelado (…)”. O que se pode deduzir é que a autoproclamada ignorância é extensiva aos seus próprios executivos. Uma pequena nota na secção Gente do Expresso adicionou um picante extra: a nomeação de familiares chegou ao seu inner circle, na pessoa da sua cunhada, Margarida Mealha, que foi assessora de Maria Cavaco Silva.

 

O que é certo é que, contrariando a mitologia, o professor tem consultado, talvez compulsivamente, a comunicação social. O próprio fez questão de o anunciar: “(…) por aquilo que li, não há comparação possível em relação ao Governo a que dei posse em 2015. E, segundo li também na comunicação social, parece que não há comparação em nenhum outro país democrático desenvolvido”. Como não sabemos que órgãos de comunicação social é que o distinto professor consultou, e através de que plataformas (em formato papel? Online?), ficaremos sempre na dúvida se essas leituras iluminaram o seu desconhecimento ou reforçaram o enviesamento ideológico de que parece padecer.

 

Para sermos justos, no meio das mensagens políticas que fez questão de passar, Cavaco Silva até teceu considerações pertinentes, nomeadamente acerca do escasso crescimento económico. E quanto à nomeação de Margarida Mealha, ocorre-me a oportunidade de citar Vasco Pulido Valente (Público, 6 de Abril): “Em 1980, também nomeei uma ex-cunhada para o meu gabinete, na maior paz de espírito. Gostava dela e ela conhecia a ‘casa’. Não me ocorreu que estivesse a cometer um tenebroso acto de nepotismo.” A questão fundamental aqui é que, socorrendo-se da amálgama de situações elencadas no espaço público, o ex-Presidente aproveitou para cavalgar a onda antigovernamental, sacrificando o rigor ao objectivo político. Perdendo a oportunidade de ser pedagógico, preferiu ser panfletário. À apologia das boas práticas e da ética republicana preferiu o enquistamento ideológico. E pelo caminho deu um calamitoso tiro no pé. Citando-o: “Só se deixa enganar quem quer ser enganado”.

 

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