DO GANGAGATE À NOMEAÇÃO DE LADY GAGO
Setembro 23, 2018
J.J. Faria Santos
Estava Portugal ainda mal refeito das confissões de Assunção Cristas (tomou “banho em pelota” no Japão, considera Lourenço Ortigão o “homem mais canhão em Portugal” mas em “termos estéticos” prefere Ricardo Robles a João Galamba”), quando nos cai em cima o Gangagate. Não é que o primeiro-ministro aterra em Luanda desgravatado (ou seria desgravitado?), de calças de ganga e mocassins. Parece que a dignidade do Estado nunca tinha sofrido tamanha afronta. Se mais ninguém houvera, a Becas (como Cristas é tratada em casa) poderia explicar-lhe que calças de ganga é indumentária apropriada para “estar nos bairros sociais”, a socializar com os pobrezinhos, nunca para visitar PALOP ricos em recursos naturais / cleptocracias em recuperação / democracias em evolução (riscar o que não interessa). Felizmente, temos o discernimento suficiente para perceber o essencial: mais importante que debater a sustentabilidade do SNS ou a redução da dívida pública é não transigir com o dress code em visitas de Estado. Senão, qualquer dia, como diria o Diácono Remédios, o homem atreve-se a cumprimentar dignitários estrangeiros com jeans rotos e esfiapados. Que o homem tenha rasgo, ainda vá lá, mas que não se atreva no rasganço!
20 de Setembro de 2018, o dia da infâmia! Sim, foi nessa funesta quinta-feira que um “passarinho” disse a Joana Marques Vidal que o seu mandato como procuradora-geral da República não seria renovado. Foi assim que Lady Bird soube que iria ser substituída no cargo por Lady Gago. As ondas de choque, comparáveis ao grau IX (destruidor) da Escala de Mercalli, motivaram mesmo o regresso à ribalta mediática do espoliado da democracia Passos Coelho. Os pontas de lança da ofensiva liberal, que fizeram os possíveis e os impossíveis para politizar a decisão, de João Miguel Tavares a Henrique Raposo, espumam de indignação – que o PS manda no país, que Marcelo foi conivente. José Manuel Fernandes, comandando o navio de assalto Observador, deplora a partida da mulher que “arrombava a porta dos poderosos” e manifesta-se cansado de “políticos e poderosos que se protegem uns aos outros”. A limitação dos mandatos perdeu todo o encanto na hora da despedida, e as tiradas com ressonância de populismo e justicialismo substituem a reflexão serena. Como se a eficácia de todo o edifício da Justiça estivesse dependente da acção de Joana Marques Vidal, a insubstituível. Como notou Pedro Adão e Silva no Expresso: “Costa e Marcelo revelaram coragem e tiveram como preocupação primordial a protecção da autonomia do Ministério Público”. Quanto a Joana Marques Vidal, sai justamente aclamada pelo desempenho do cargo (ainda que não isento de falhas e equívocos), ao mesmo tempo que se vê livre do risco de ser encarada como a procuradora-geral de uma facção. A sua sucessora, Lucília Gago, foi definida pelo ex-ministro e deputado do CDS Pedro Mota Soares como “uma pessoa muito serena, muito ponderada, muito competente e com grande capacidade de liderança”. Temos o dever de desconfiar, diz José Manuel Fernandes, porque agora tudo passou a ser político (a política, que horror!). Portanto, Lady Gago, Big Brother José Manuel Fernandes is watching you!