COMUNISTAS ACIDENTAIS
Março 05, 2023
J.J. Faria Santos
Como notou esta semana Helena Roseta, o arrendamento forçado consta da Lei da Bases da Política Pública de Solos, legislação promulgada em 2014 com a assinatura de três renomados “comunistas”: Assunção Esteves, Cavaco Silva e Pedro Passos Coelho. Nesse mesmo ano, Rui Moreira, preocupado com “o crescimento vertiginoso das transacções na baixa e no centro histórico da cidade”, receoso de que “a população autóctone” pudesse “ser expulsa” e declarando não querer “transformar o Porto na República Dominicana das cidades”, admitiu , “no limite”, avançar com expropriações para proteger espaços de interesse municipal. Uma pulsão “bolivariana”, portanto. Donde, “comunista”.
Se das personalidades passarmos para as nações, no Reino “comunista” da Dinamarca o dono de um imóvel que esteja desocupado mais de 6 semanas sujeita-se à obrigação de o arrendar. Já no Reino Unido, se uma casa estiver desabitada durante mais de 2 anos pode ser requisitada para posterior arrendamento a preços acessíveis. O mesmo sucede na comunidade autónoma “comunista” da Catalunha.
É irónico que políticos e comentadores (sem esquecer que há muitos que acumulam as duas funções) ideologicamente motivados e empenhados como Paulo Portas e Marques Mendes (que aludiu a um “ataque de socialismo radical”) clamem por uma deriva esquerdista, sem grande preocupação em analisar com profundidade as medidas em discussão, embarcando com volúpia na análise superficial. Quanto ao comentador-mor, chamou “melão” ao pacote de medidas para a habitação. Se for como o fruto de casca resistente e polpa suculenta, com propriedades que fortalecem o sistema imunológico, pode ser que as medidas para a habitação acabem por deixar algumas individualidades com um grande melão. Às vezes o soundbite bites back.
Imagem: 24.sapo.pt / Lusa