A COLIGAÇÃO PSD-PP-PR E A CASSETE DE BELÉM
Março 11, 2015
J.J. Faria Santos
Nas jornadas parlamentares do PSD, comentando as notícias acerca do seu incumprimento em relação às obrigações perante a Segurança Social, Pedro Passos Coelho qualificou-as de “chicana política”, aludiu ao “desespero” de certos quadrantes políticos e acusou-os de terem pouco a oferecer. Alguns dias depois, referindo-se ao mesmo assunto, Cavaco Silva afirmou: “Um Presidente da República de bom senso deve deixar aos partidos as suas controvérsias político-partidárias que já cheiram a campanha eleitoral”. Eis um cristalino exemplo de cooperação institucional. Ou será cumplicidade política?
Na mesma semana em que Miguel Sousa Tavares escreveu no Expresso, sobre Cavaco Silva, que “se fica longas temporadas invisíveis ou em silêncio (o que o país agradece), revela a sua absoluta irrelevância, conquistada por exclusivo mérito próprio; se resolve mostrar-se e abrir a boca, cai-lhe irremediavelmente em cima a irritação e o desprezo de um povo que já não o suporta…”; e que Vasco Pulido Valente se referia a ele, no Público, como um político “agora tão retirado que o boato da sua prematura morte já corre pela província”, o Presidente da República decidiu fazer prova de vida. Disse que não era “comentador político” mas comentou no sentido de ratificar a tese do primeiro-ministro. Disse que tem “muita experiência para saber distinguir entre aquilo que são jogadas político-partidárias e o que são outras explicações”, e ficamos sem perceber se o seu próprio comentário era uma explicação ou uma jogada político-partidária. É que ele tem experiência… E voltou à ladainha da necessidade de evitar “crispações”, a sua cassete, cuja efeito, por mais mitigado que fosse, só se manifestaria se ele tivesse preservado a sua independência e a sua autoridade.
É um pouco surpreendente este desinteresse de Cavaco Silva pela Segurança Social. Longe vai o tempo em que, preocupado com o excesso de funcionários públicos, lamentava não poder reformá-los devido ao efeito negativo nas receitas da CGA e do IRS, pelo que, dizia então, “só resta esperar que acabem por morrer”. Mais recentemente, em 2011, revelava que a reforma da mulher não chegava “a 800 euros por mês”, o que a tornava dependente dele. Um ano depois, mostrava-se sabedor da quantia mensal que iria receber da CGA, após quarenta anos de desconto como professor universitário e investigador da Fundação Calouste Gulbenkian: “irei receber 1300 euros por mês”. Na altura, não sabia ainda quanto iria receber do fundo de pensões do Banco de Portugal, mas tudo somado “quase de certeza” que não chegaria para as suas despesas.
Sendo a Segurança Social portuguesa financiada pelo método da repartição, com as despesas correntes com as pensões a serem financiadas pelas contribuições, o que significa que cada beneficiário constrói a sua carreira contributiva ao mesmo tempo que financia as pensões em pagamento, seria de esperar que o Presidente da República fosse sensível à liquidação atempada e na íntegra das contribuições para a Segurança Social. Ainda para mais quando esta enfrenta os desafios colocados pela demografia, pelo aumento da esperança de vida e pelo baixo crescimento económico.
Os americanos usam frequentemente a expressão lame duck para qualificar os eleitos em fim de mandato ou com um desempenho abaixo das expectativas. Segundo um artigo de Megan Garber no site da The Atlantic, o qualificativo foi pela primeira vez usado enquanto “epíteto presidencial” para qualificar a acção de Calvin Coolidge e a sua origem remonta a uma declaração de Lincoln. O nosso “pato coxo” arrasta-se penosamente entre silêncios inconcebíveis e declarações desastradas. Mais que lame duck, ele é um sitting duck, vulnerável perante disparos de todas as direcções menos duma. Já não é possível ajudá-lo “a acabar o mandato com dignidade”.