LICENÇA PARA MATAR EM ABBOTTABAD
Agosto 11, 2011
J.J. Faria Santos
A New Yorker publicou um extraordinário relato de Nicholas Schmidle acerca da operação que conduziu à eliminação física de Osama Bin Laden (Getting Bin Laden). Acompanhamos os acontecimentos desde o momento em que 23 Navy Seals, um tradutor e um cão (chamado Cairo) embarcaram em dois helicópteros (modificados para ocultar o calor, o ruído e o movimento), até ao momento em que, após provocarem a destruição de um Black Hawk que se avariara, abandonaram Abbotabad perante o choque e a surpresa de quem assistia e as incessantes imprecações de Amal, a quinta mulher de Bin Laden. A narrativa lê-se como um livro de aventuras, com o encadeamento e o ritmo de um best-seller, com cirúrgicas digressões que enquadram as peripécias. Não faltam sequer os episódios burlescos para quebrar a tensão, como por exemplo a atribulada chegada ao solo de um helicóptero, por entre vacas, galinhas e coelhos em debandada. Entre a aterragem dos helicópteros e os dois tiros fatais que derrubaram o desarmado símbolo do terror decorreram apenas dezoito minutos. O pormenor de duas das suas mulheres se terem colocado à frente dele, funcionando como escudo, diz muito, quer sobre uma ideologia que glorifica o martírio, quer sobre uma sociedade falocêntrica que desvaloriza a condição feminina. Apoiado nas declarações de um operacional, o autor sustenta que nunca se pusera a hipótese de capturar Bin Laden, ou seja, desde o início se tratara de uma missão com licença para matar. O que talvez explique as singelas palavras proferidas a quente por Obama: ("We got him"), algo que mais depressa imaginaríamos na boca do cowboy George W. Bush. Ainda assim, compreende-se o desabafo. Como Ben Rhodes, vice-conselheiro nacional de segurança, fez notar, os operacionais apostaram as suas vidas e Obama a sua Presidência.