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NO VAGAR DA PENUMBRA

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O CORAÇÃO DAS TREVAS

Agosto 01, 2013

J.J. Faria Santos

Quando pensamos na guerra, rapidamente nos ocorre a quantidade de atrocidades que se cometeram em nome dos mais nobres princípios, como a justiça ou a própria salvaguarda da dignidade humana. Apesar de toda a retórica associada a conceitos como “ataque cirúrgicos” e a formas de combate à distância com a utilização de drones, os grandes conflitos continuam a ser resolvidos com recurso a violentas demonstrações de poderio militar com o inevitável cortejo de danos colaterais. Ao nível micro, nos campos de batalha, é fácil perceber que o espírito de camaradagem e de entreajuda que se forma entre os combatentes pode, por força de danos psicológicos motivados pela visão do inominável,  muito facilmente redundar numa orgia de retaliação sem freios.  Do choque e pavor à dessensibilização vai um passo.  

Em Pássaros Amarelos  (Bertrand Editora, tradução de Ana Falcão Bastos), Kevin Powers escreve, na pele de um combatente no Iraque, “Só prestávamos atenção às coisas raras, e a morte não era rara”. E é porque os grandes decisores e os grandes estrategos militares, apesar de toda a parafernália tecnológica bélica, precisam de elevados contingentes de executores, de preferência altamente impressionáveis por valores como o patriotismo e com propensão para a obediência inequívoca a símbolos de autoridade,  que Powers escreve igualmente  que “as guerras também precisam de rapazes banais”.

A guerra é inevitável? Admitamos que sim. Mas o simples facto de que, como escreveu Hannah Arendt em 1969 (Reflections on violence) , “toda a violência contém em si um elemento de arbitrariedade; em nenhum lugar a Fortuna, a boa ou má sorte, desempenha um papel mais importante nos assuntos humanos do que no campo de batalha”, deveria ser um poderoso inibidor de tiradas grandiloquentes acerca das virtudes das grandes operações militares com nomes épicos. Arendt frisou o consenso entre os politólogos no que concerne à noção da violência ser “a mais flagrante manifestação de poder”. Notando que a violência “precisa de justificação e pode ser justificável”, a autora alertou para o facto dela perder “plausibilidade” à medida que se prolonga no tempo e, mais importante ainda, escreveu que “a violência pode sempre destruir o poder”. O que transforma o desencadear de qualquer acto de violência numa roleta russa.

 

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