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NO VAGAR DA PENUMBRA

NO VAGAR DA PENUMBRA

12 PASSAS DE SABEDORIA PARA ENTRAR EM 2019

Dezembro 30, 2018

J.J. Faria Santos

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“Os homens têm sempre alguma coisa de patético, em qualquer idade. Uma insolência frágil, uma audácia temerosa. Hoje já nem sei se alguma vez despertaram em mim amor ou apenas uma afectuosa compreensão pelas suas fraquezas.”

                            Elena Ferrante

 

“As mulheres novas guardam a imagem da sua juventude desde pela manhã; as mais velhas têm de corrigir a impressão que lhes deixou o primeiro olhar do dia.”

                            Agustina Bessa-Luís

 

“Acredito certamente que todos sofremos danos, de uma ou outra maneira. Como podíamos não sofrer, se não existe um mundo de pais, irmãos, vizinhos e companheiros perfeitos? (...) Alguns admitem o dano e tentam suavizá-lo; outros passam a vida a tentar ajudar outros que sofreram danos; e há depois aqueles cuja maior preocupação é evitar mais danos para si próprios, a qualquer preço. Esses são os implacáveis, aqueles com quem devemos ter cuidado.”

                            Julian Barnes

 

“O ódio, tens ainda de aprender, é intelectualmente considerado como a Negação Eterna. Considerado do ponto de vista das emoções é uma forma de Atrofia. E tudo mata, menos a si próprio.”

                            Oscar Wilde

 

“Sei que o amor é um trabalho difícil; temos de sujar as mãos. Se não nos entregarmos, nada de interessante acontece. Ao mesmo tempo, é preciso encontrar a distância certa entre as pessoas. Demasiado perto, e elas dominam-nos; demasiado longe, e elas abandonam-nos. Como as poderemos manter na relação certa?”

                            Hanif Kureishi

 

“Não temos saída: aquilo que nos resta, que é muito pouco, é recomeçar sempre: recomeçar sempre é cansativo. Mas não nos rendemos: não nos rendamos.”

                            José Riço Direitinho

 

“Todos temos por onde sermos desprezíveis. Cada um de nós traz consigo um crime feito ou um crime que a alma lhe pede para fazer.”

                            Bernardo Soares

 

“O tempo humano não anda em círculo, mas avança em linha recta. Por isso o homem não pode ser feliz: a felicidade é desejo de repetição.”

                            Milan Kundera

 

“A memória é a nossa encenadora, aquela que organiza a nossa vida. É ela quem escolhe a sequência, o corte, a colagem, a ordem e que, de acordo com o seu talento, faz da mais banal vida um romance.”

                            Isabel Marie

 

“O silêncio é a melhor defesa contra as não-entidades – deixa-as tornarem-se insubstanciais, como um nevoeiro em retirada.”

                            Richard Ford

 

“Na masmorra do coração vivem palavras implacáveis. Nunca se compadecem, nunca perdoam. Estão aprisionadas.”

                            Norman Mailer

 

“O passado tem todo o tempo do mundo. É apenas o futuro que se esgota.”

                            Edward St Aubyn

 

 

Fontes: “Crónicas do Mal de Amor” de Elena Ferrante; “A Ronda da Noite” de Agustina Bessa-Luís; “O Sentido do Fim” de Julian Barnes; “De Profundis” de Oscar Wilde; “Intimidade” de Hanif Kureishi; “O Escuro Que Te Ilumina” de José Riço Direitinho; “Livro do Desassossego” de Bernardo Soares; “A Insustentável Leveza do Ser” de Milan Kundera; “A Criada” de Isabel Marie; “Francamente Frank” de Richard Ford; “O Evangelho Segundo o Filho” de Norman Mailer; “Leite Materno” de Edward St Aubyn.

Imagem: Courtesy of Bert Christensen

OS NOVOS DÉSPOTAS E A LITERATURA COMO ANTÍDOTO

Dezembro 23, 2018

J.J. Faria Santos

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“O déspota da velha guarda”, explica Karl Vick na Time, “recorria à censura”. Já “o déspota moderno, considerando tal acção mais difícil, fomenta a desconfiança nos factos credíveis”. Nem que para tal tenha de recorrer à mais grosseira das mentiras. E como recorda o editor Edward Felsenthal na mesma revista, “a primeira jogada do manual do autoritarismo [é] controlar o fluxo da informação e do debate, que é o que alimenta a liberdade”. Erguer uma firewall que resista às tiradas dos populistas sem escrúpulos, numa altura em que os media tradicionais sucumbem perante a ditadura do clickbait, parece uma tarefa idêntica à de Sísifo, mas é uma premissa irrecusável para a prática de um jornalismo que assegure a divulgação objectiva dos factos. Como afirmou o sociólogo Daniel Patrick Moynihan, citado por Michiko Kakutani num seu ensaio recente, “todos têm direito à sua verdade, mas não aos seus próprios factos”.

 

Em A Morte da Verdade – A Falsidade na Era de Trump (Editorial Presença com tradução de Alberto Gomes), Michiko Kakutani considera que a ascensão do Presidente americano é o culminar de um conjunto de factores que contribuíram para “debilitar a verdade, desde a fusão de notícias com entretenimento, passando pela polarização tóxica que se apoderou da política norte-americana, até ao crescente desprezo populista pelo conhecimento especializado”. Kakutani recorda a comparação entre visões distópicas, feita por Neil Postman em 1985, onde este defendia que enquanto George Orwell em 1984 “temia aqueles que pudessem privar-nos de informação”, Aldous Huxley no seu Admirável Mundo Novo receava “que nos brindassem com tantas coisas ao ponto de ficarmos reduzidos à passividade e ao egoísmo”. Parecendo evidente que a abundância de fontes e a febre de viver online nos aproxima do “modelo” de Huxley, a autora considera fundamental não sucumbir à “fadiga do ultraje” que poderá conduzir ao “cinismo” e à “lassidão”. É preciso resistir.

 

Primeiramente, os reality shows destronaram as telenovelas; agora, o fluxo de notícias dos canais por cabo aniquilou os reality shows. A tese é de Michael Hirschorne, explanada num artigo na Vanity Fair de Dezembro (The cable-news addiction epidemic). Graças à indignação ininterrupta com origem na Casa Branca, explica ele, os canais por cabo são o destino dos que anseiam por ver o que se está a passar, “neste caso, ver em tempo real a nossa democracia a implodir”. E todos participam numa ilusão colectiva: a de que se mantêm informados e participam (através do Twitter ou do Facebook) na discussão política. Na verdade, acabam todos arrastados, conclui Hirschorne, para “um miasma de efemeridade e desinformação que os suga para o vortex trumpiano do pós-significado”.

 

Podemos imaginar a literatura na linha da frente da resistência ao assalto à verdade. Michiko Kakutani, no já citado ensaio, argumenta que “se um romancista tivesse engendrado um vilão como Trump (…) provavelmente teria sido acusado de extremo artifício e implausibilidade”. É a realidade a ultrapassar a ficção. Jennifer Egan, a celebrada autora de A Praia de Manhattan, defende na Time que tanto a literatura quanto a democracia se desenvolvem a partir da “pluralidade de ideias”. “Ao lermos e escrevermos”, prossegue, “recordamos a nós próprios o valor da empatia, da subtileza e da contradição”.  E conclui considerando que “a literatura é o antídoto para as distorções cegas – bem contra o mal, nós contra eles – que são exploradas facilmente por aqueles que nos querem manipular”.

 

Imagem: La Verité sortant du puits armée de son martinet pour châtier l'humanité de Jean-Léon Gérôme

RESMAS DE CARTAZES À BEIRA DA ESTRADA

Dezembro 18, 2018

J.J. Faria Santos

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Porventura receando que Portugal não a esteja a escutar, Assunção Cristas propõe-se ouvir Portugal. No interim, prossegue, afincadamente, a denúncia da catástrofe promovida pelas “esquerdas encostadas”. Já está estabelecida a sua sólida reputação de franco-atiradora, de impiedosa sniper apontando a mira ao primeiro-ministro, que acusa repetidamente de cobardia e falta de carácter, constituindo-se, assim, como o supremo “irritante” do consulado costista. Mas também a restante oposição não escapa à sua fúria, acusada de colaboracionismo ou calculismo. Ao PSD chama o partido da “colaboração”, ao passo que acusa a nova criação de Santana Lopes de não recusar “dar a mão” a quem ela quer dar com os pés.

 

Apostando no impacto visual das suas acções, Assunção Cristas propõe-se agora sinalizar com cartazes as estradas que constituem um perigo para os seus utilizadores. Claro que lhe falta a fúria avassaladora da fabulosa Frances McDormand em Três Cartazes à Beira da Estrada, mas não será este o exemplo a seguir. Uma atitude destas, violentamente aguerrida, aproximar-se-ia demasiado da caricatural angry woman feminista, um pecado num partido democrata-cristão, mesmo na versão 2.0. O partido já estará suficientemente traumatizado com a ligeireza com que ela divulga as circunstâncias dos seus banhos em pelota, ou com a liberdade linguística com que se propõe qualificar os galãs lusitanos. Mais recato, dir-lhe-ão com toda a probabilidade. Mais visitas a pobrezinhos e menos tiradas pouco ortodoxas. Nem toda a nudez será castigada, mas não há necessidade de a publicitar.

 

Cristas terminou o jantar de Natal do seu partido com os votos de um santo Natal. Esperemos que sejam extensivos ao primeiro-ministro cuja “palavra não vale nada”. Nem que seja em nome da caridade cristã ou da virtude da temperança. Embora se compreenda que possa ser mais fácil aprovar “à distância” um diploma congeminado por parceiros de Governo que nunca foi alvo de discussão aprofundada do que saudar inimigos políticos juramentados.

MACBETH APLICADO À POLÍTICA PORTUGUESA

Dezembro 11, 2018

J.J. Faria Santos

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O que poderia dizer Rui Rio no Conselho Nacional do PSD

“Onde estamos, há punhais escondidos nos sorrisos – quanto mais parente, mais malevolente.”

 

O que poderia dizer, sobre Rio, Luís Montenegro

“Onde poderia ter vantagem, ele perdeu-a, já que grandes e pequenos contra ele se revoltaram, e só o acompanham alguns pobres constrangidos, de coração ausente.”

 

O que poderia dizer Passos Coelho aos que o incitam a regressar

“Se o acaso me quer rei, que o acaso me coroe; sem a minha intervenção.”

 

O que poderia dizer o juiz Alfredo Costa a Orlando Figueira

“A justiça aproxima-nos dos lábios o veneno que nós próprios preparámos.”

 

O que poderia dizer Marcelo aos que censuram o seu frenesim

“O repouso é cansativo, se me impede de servir-vos.”

 

O que poderia dizer Jerónimo de Sousa

“Nada se conquista, tudo são reveses, quando sem satisfação é um desejo alcançado.”

 

O que poderia dizer Catarina Martins

“ Eu não tenho esporas para espicaçar no flanco o meu desígnio; tenho apenas a ambição, que se ergue sobre a sela, impetuosa, mas apenas pra cair do outro lado do cavalo.”

 

O que poderia dizer Assunção Cristas aos seus correligionários

“Animai-vos tanto quanto puderdes, pois longa é só a noite à qual o dia não sucede.”

 

O que poderia dizer António Costa

“ Em breve poderemos claramente confrontar o que queremos com aquilo que o futuro nos reserva. O pensamento exprime incertas esperanças; Certezas, propriamente, só a guerra nos trará. E em direcção a elas – avancemos!”

 

Citações extraídas de Macbeth, de William Shakespeare, edição da Relógio D’Água com tradução de José Miguel Silva

Imagem: Macbeth e as Bruxas de Francesco Zuccarelli

A ONTOLOGIA DO TOURO E A TOURADA LIGHT

Dezembro 04, 2018

J.J. Faria Santos

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A discussão inflamou-se com o combustível ministerial. Uma questão de civilização, de recusa da barbárie, disseram uns; fundamentalismo da causa animal, recusa da tradição, liberdade ameaçada, afirmaram outros. Adquirido civilizacional versus ditadura do gosto. A refrega culminou com um desagravamento fiscal, que teve direito a banda sonora e a um efusivo “olé”, ambos cortesia do deputado Campos Ferreira.

 

Do ponto de vista dos aficionados, é no combate valoroso entre o homem e o touro que este último demonstra a sua natureza, se realiza enquanto ser vivente. E se porventura o leitor se incomodar com esta estranha forma de vida, com o seu quê de masoquista, saiba que, citando o site touradas.pt , o touro “tem reacções hormonais únicas no reino animal (que lhe permitem anestesiar-se quase imediatamente)”.

 

Um dos mais notáveis contributos deste site é a interpretação autêntica dos sons emitidos pelo touro, o que me leva a propor, no contexto de modalidades alternativas de tourada light, que, para além do velcro, se estudem formas de acoplar ao touro um microfone que amplifique os seus desabafos e imprecações, o que permitiria a arbitragem das suas motivações de uma forma inequívoca.

 

Vejamos um exemplo: se em plena arena, o touro emitisse um mugido (que é descodificado como uma “queixa”), não seria de concluir que não estava disponível para exibir a sua bravura? Podia estar doente ou a sua natureza ter sido pervertida…E por falar em perversão, se por acaso ele soltasse um bramido, definido como “um som irritado característico da época do cio e do acasalamento”, não seria avisado (atendendo à integridade física e ao direito à autodeterminação sexual dos forcados) interromper a faena? Já se o valoroso touro expelisse um verraqueo (semelhante ao “grunhir do porco” que indicia “enfado”), era de caras o toque de finados da pega, o fim da bandarilhada. Um touro enfadado é fado que não se deseja a nenhum dos gladiadores; nem ao homem que desesperadamente incita o animal, nem ao touro que nega a sua natureza cedendo à apatia. Deste modo, nem a cultura justifica a quebra na receita fiscal, nem a barbárie se concretiza de forma a justificar a indignação de uns e a aclamação de outros.

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