ADYTAMENTO
Junho 26, 2018
J.J. Faria Santos
Para simplificar, imaginem uma versão masculina de Amy Winehouse. Letras pessoais, francas e por vezes brutais, sem inibições de recorrer ao calão, suportadas por um edifício sonoro assente no neo-soul, no smooth jazz, no funk e nas inúmeras variações do rhythm and blues. Acrescentem-lhe, nas palavras de um crítico do Guardian que o viu em concerto, “uma voz fluida, uma apetência pelo drama e um ouvido para refrãos orelhudos” e têm uma noção minimamente aproximada do trabalho de Ady Suleiman.
Natural de Nottingham, Suleiman é um músico socialmente comprometido com as questões da saúde mental, lamentando o estigma que recai sobre os doentes e fazendo notar que muitas vezes uma versão distorcida da masculinidade impede que os homens falem sobre a doença e procurem ajuda, como se a demonstração de vulnerabilidade fosse uma fraqueza inconfessável. Em entrevista ao New Musical Express no ano passado, explicou que podemos nunca ter a noção de como determinada pessoa se sente, dando o exemplo recorrente de como um sorriso no rosto de alguém pode disfarçar uma depressão.
Embora esta temática esteja presente nas suas letras, o assunto recorrente das suas canções são as relações amorosas, o que está bem patente no seu álbum Memories. Evoca-se a conquista mas também a perda, concretizada ou receada. O lamento pelo amor passado é abordado num tom depreciativo, combinado com a ironia, de quem não soube valorizar o que tinha (canta ele em I Remember: “I remember when we were fucking / Now I’m writing love songs about how we were once”. Já o receio pela consistência do amor presente é abordada no soberbo Longing for Your Love: “And if you leave you are just a memory / A faded shadow that haunts my dreams”. Regateia tempo, alicia a amada com palavras que ainda não disse, reafirma o amor todos os dias. É que as memórias são preciosas mas insuficientes. E no amor para preservar é preciso perseverar.