DA REACÇÃO VAGAL À REACÇÃO VAGAROSA
Novembro 25, 2015
J.J. Faria Santos
"Temos estudado todos, todos os cenários, todos os cenários foram estudados na Presidência da República ao longo deste tempo, agora só nos falta saber qual o cenário que vai ser determinado pelos portugueses depois da sete da tarde", afirmava ele depois de ter exercido o seu direito de voto em Outubro passado. Aparentemente, um cenário para ele impensável tolheu-lhe os passos, fez ressurgir o político arrogante, ressentido e ressabiado, e fez arrastar uma decisão que o Parlamento tornou cristalina, enquanto fazia desfilar uma procissão de figuras e aguardava, decerto, uma “inspiração da Nossa Senhora de Fátima” para a definição de uma solução credível, estável e duradoura. E a caricatura cruel de um fim de mandato penoso sintetiza-se assim: enquanto Mário Centeno desenvolvia contactos fundamentais para que a DRBS mantivesse o rating de Portugal, e Marcelo Rebelo de Sousa tratava de tranquilizar o presidente da Comissão Europeia, o Presidente da República teorizava sobre governos de gestão do século passado e sobre a fruticultura madeirense.
O Presidente de direita, que tem sido sobretudo o Presidente da direita, sabotou o seu próprio perfil institucionalista e deixou-se condicionar pelos seus humores viscerais e pelas suas preferências pessoais, insinuando vetos à participação de forças políticas no Governo e sugerindo veladamente insurreições. Seria ingénuo ver nesta demora sinais de ponderação, rigor e justeza, sendo tão evidente o intuito dilatório das manobras e a indisfarçável contrariedade presente no tom acintoso das proclamações.
Um ex-Presidente da República, que soube ser factor de união e dignificar o cargo sem prescindir do uso dos seus poderes, Jorge Sampaio, contrariando a ideia de ter um discurso críptico e hermético, foi claro na definição do essencial: “Desenganem-se (…) os que pensam que a democracia se pode suspender em nome dos humores dos mercados ou da estabilidade entendida como negação de alternativas”.
Cavaco Silva precisou que os “parceiros sociais” e as “instituições e personalidades da sociedade civil” lhe confirmassem que um Governo de gestão “não corresponderia ao interesse nacional”. Contrariado, quase amuado, “indicou” para primeiro-ministro António Costa. Uma atitude que não surpreende se tivermos em mente a forma ideologicamente assimétrica como tem exercido o seu mandato.