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1. No Relatório do Orçamento de Estado para 2012, apresentado em Outubro de 2011, afirmava-se taxativamente: “A redução do défice vai ser realizada predominantemente pela via da redução da despesa (significativamente mais de 2/3) sendo o restante assegurado pelo aumento das receitas”. Esta proporção mantém-se no Orçamento Rectificativo?
Respondo eu: Não. Aparentemente, o objectivo da consolidação orçamental pelo lado da despesa foi abandonado ou adiado. A UTAO, na versão preliminar do seu parecer técnico acerca do Orçamento Rectificativo, nota que “a receita explicará cerca de 3/4 (2,3 p.p. do PIB) do esforço de correcção orçamental a realizar em 2012”.
2. Qual o efeito das decisões que minimizam o impacto ou excluem do esforço de contenção de despesa algumas empresas e grupos profissionais?
Responde Manuela Ferreira Leite: “(…) a existência de excepções, qualquer que seja o seu fundamento, lança dúvidas sobre a imprescindibilidade das medidas adoptadas e torna-as, aos olhos do cidadão, em decisões dirigidas a pessoas específicas e não para alcançar objectivos concretos em que todos se enquadram”.
(Expresso, 17/03/2012)
3. Como avaliar as convicções ideológicas do Governo e a sua consonância com o património doutrinário do principal partido que o sustenta?
Responde Pacheco Pereira: “Os mais veementes aplausos à acção governativa vêm de poderosos interesses na sociedade portuguesa, que pouco têm a ver com o eleitorado ‘genético’ do PSD ou com os portugueses que é suposto representar pelo seu programa e acção. A deslocação à direita foi tão violenta, sem rigor nem memória, que hoje um moderado do PSD que tente reformular no actual contexto algumas preocupações que fazem parte do gene PSD parece um adversário do capitalismo e da liberdade económicos”.
(Público, 17/03/2012)
4. Faz sentido a ideia dos opositores do Governo de flexibilizar as metas do défice?
Responde Abebe Selassie (chefe de missão do FMI): “Se a economia tiver um desempenho mais fraco do que o previsto, ou se o ambiente externo se degradar mais, perseguir metas nominais fixas de défice pode não ser a melhor política e agravará ainda mais a recessão”.
(Público, 14/04/2012)
5. Como qualificar as contradições no discurso governativo acerca dos cortes nos subsídios de férias e de Natal?
Responde Nicolau Santos: “Dois anos são dois anos, não são três nem quatro, nem quatro e meio. Dois anos são 2012 e 2013, não 2014 e reposição gradual e parcial dos referidos subsídios só em 2015. Não há outra expressão para qualificar o que se passou: o Governo mentiu”.
(Expresso, 14/04/2012)
6. Devemos associar a suspensão das reformas antecipadas a um iminente colapso a curto prazo da segurança social?
Respondo eu: Tudo indica que esta decisão do Governo está associada a motivações conjunturais, que se relacionam com o cumprimento das medidas do défice. Dito de outra forma: é mais uma questão de tesouraria que de sustentabilidade do sistema. O relatório do Orçamento do Estado para 2012, publicado em Outubro de 2011, continha um anexo intitulado Relatório sobre a Sustentabilidade Financeira da Segurança Social. Nesse documento, procede-se a uma actualização das projecções de longo prazo relacionadas com a dita sustentabilidade. As novas previsões levaram em linha de conta a quebra esperada para a população residente em Portugal entre 2010 e 2050, as alterações legislativas já em curso, o estipulado no Memorando de Entendimento e uma previsão de crescimento real da economia até 2050 inferior a 2%. Em jeito de conclusão, refere este relatório: “Com a previsão do primeiro saldo negativo do subsistema previdencial a ocorrer entre 2030 e 2035, os rendimentos e as valias geradas pelo fundo deverão permitir que, até 2040, o valor acumulado do FEFSS seja suficiente para garantir, anualmente, o pagamento das despesas totais de pensões do regime contributivo e que, em 2050, o fundo apresente um valor correspondente a cerca de 2,5% do PIB.”
Sendo avisado acompanhar a evolução e reforçar os mecanismos que garantam a sustentabilidade da segurança social, parece-me intelectualmente desonesto deixar instalar a sombra de um colapso iminente. Além do mais, tal ideia seria desastrosa para a aura de competência técnica da equipa do Ministério das Finanças, desmentindo de forma avassaladora um relatório publicado seis meses antes, ainda por cima apoiado em modelos analíticos e cenários macroeconómicos elaborados pelo departamento de estatística da União Europeia, pela própria Comissão Europeia ou pela OCDE.