A INOCÊNCIA
Janeiro 29, 2012
J.J. Faria Santos

A revista Paris Match, na edição derradeira do ano passado, decretou 2012 o “Ano Marilyn”. Afirmando que “a bomba sexual escondia uma inteligência à flor da pele”, comparou-a a uma Fénix “ainda mais brilhante a cada ressurreição(…) por fim amada, ela que morrera de falta de amor”. No artigo de fundo, não escamoteando os desequilíbrios da actriz, nem a sua imaturidade afectiva, Catherine Schwaab, defendeu que “mais ainda que o seu corpo magnífico, é o seu rosto que perturba: uma inocência, um carácter, uma sedução desarmada”.
Os tópicos da inteligência e da inocência foram também abordados por Lee Siegel, num artigo para a New York Review of Books. Siegel não contesta a inteligência, mas desqualifica-a como actriz (“dreadfull actress”). O cerne da peça, porém, centra-se na denúncia da forma como as diversas abordagens à vida de Marilyn parecem ignorar deliberadamente a sua voracidade sexual, considerando ter sido Arthur Miller o responsável pela sua dessexualização, retratando-a como uma vítima inocente. Ainda assim, considerou que Marilyn representava um outro tipo de inocência, “que procurava a gratificação dos instintos sem qualquer consideração pelas consequências sociais e emocionais”. Termina, concluindo que “esta mistura de inocência e corrupção é uma condição intolerável, preferivelmente confinada ao ecrã, e escondida sob a ficção respeitável de uma apropriada tragédia americana”.
Se considerarmos que a inocência é a pureza e a simplicidade, mas também a ausência de culpa ou até a credulidade, e conferirmos uma natural subjectividade às grelhas de comportamento que balizam o que é ou não apropriado, talvez a encontremos nessa desordenada busca de afecto que foi a vida do mito.