PIN (PESSOA IMPORTANTE PARA NÓS)
Outubro 29, 2011
J.J. Faria Santos
"OPHELIA" DE JOHN EVERETT MILLAIS
Sentada no sofá, A. juntava as mãos no regaço e, com os dedos unidos, rodava os polegares, um em redor do outro; M.A, quando ria, parecia fazer afluir ao rosto todos os vasos sanguíneos e estar na iminência de rebentar de hilaridade; G., que se parecia realizar como pessoa no acto de ser útil ao outro, insistia em ajudar nas tarefas domésticas das pessoas a quem fazia visitas sociais; R. que se irritava quando alguém solicitava a sua presença, sabotando assim as suas sagradas rotinas, acabava por se exceder na delicadeza com que fatalmente acederia em falar com quem o perturbava. Onde alguém poderá ver hipocrisia, eu descubro uma louvável regra de civilidade. Eram todos pessoas comuns que sucumbiram à sua condição de mortais. Não tinham estatuto VIP (Very Important Person); tinham estatuto PIN (Pessoa Importante para Nós). Para nós, os que lhes reconhecíamos as qualidades e tolerávamos os defeitos. Dispenso romarias a cemitérios com data marcada. Respeito, mas dispenso. É assim que os prefiro evocar – rememorando os seus gestos e os seus hábitos.
Em relação à morte, esse destino inerente à condição humana, podemos concordar com as palavras do rei, dirigidas ao seu sobrinho Hamlet na peça homónima de Shakespeare, acerca do falecimento do pai deste: “…para que havemos nós de tomar a peito com uma oposição pesarosa o que sabemos que necessariamente se há-de dar e que é coisa ordinária desde que estamos no mundo? “. Mas jamais saberemos, até sermos confrontados com a terrível provação, se não teremos um comportamento idêntico ao de Laertes, na mesma peça, pranteando a irmã, e que suscitou as seguintes interrogações de Hamlet: “Quem é esse que exprime a sua dor com tais exageros? E a espelha em frases prontas para esconjurar as estrelas errantes e torná-las imóveis como ouvintes assombrados de medo?”